Completei no último domingo,
13/07/2014, além dos 51 anos de idade, praticamente 30 dias assistindo os jogos na Copa do Mundo de
Futebol que se realizou no Brasil. Não era a final que eu queria ver no dia do
meu aniversário. O Brasil decepcionou como nunca e levou duas goleadas
acachapantes e ficou em quarto lugar. Completei também, 40 anos assistindo a Copa pela TV.
Eu e Nicole na torcida pelo Hexa! |
Restou-me torcer pela Argentina, mais por
solidariedade latino-americana (se bem que isso não passou na cabeça da maioria
dos torcedores brasileiros, em virtude da eterna rivalidade com os hermanos) do
que por um futebol vistoso. A Alemanha mereceu a conquista por sintetizar o que
de melhor se viu de outras seleções – inclusive o Brasil – desde o surgimento
da Copa do Mundo em 1930.
Assisti a quase todos os jogos
desde a abertura (aquela coisa horrível, com “padrão Fifa”) em 12/06, aproveitando as férias que tirei para cuidar
da caçulinha Nicole que acabara de nascer. Até tentei dar um apoio logístico ao
bebê, mas confesso: assistir os jogos da Copa pela TV é um costume que completa
40 anos e do qual não consigo me desvencilhar e a mãe acabou ficando mais tempo
com a pequerrucha. Num certo dia, torci com tanta ênfase que assustei Nicole e
peguei até um ralho da mãe dela, Ana Charlene...
A Copa e a política
Logicamente que uma Copa em ano
de eleição acontecendo em nosso país, só podia ser usada como escudo de
ambições de grupos de extrema direita e de extrema esquerda que usaram a mídia
para desgastar o evento, apesar da mesma mídia precisar deste evento para seus
objetivos comerciais. A ideia era mostrar que a Copa seria uma porcaria e que a
culpa era da atual presidente que tenta sua reeleição.
Mas como a direita é
péssima em ir pras ruas protestar, a esquerda mais utópica se encarregou de fazer
esse papel levantando bandeiras vermelhas e atacando a antiga esquerda (que
hoje está no centro e já quase caindo pra direita) que comanda o País. Até a
bola rolar. Os black-blocks não resistiram à mania nacional que é o futebol. E nada do que se previu na organizações dos jogos aconteceu. A imprensa internacional reverenciou a Copa das Copas!
Já vivi os dogmas da esquerda no
passado com maior ênfase, ao ponto de declarar como um mantra que “o futebol é
ópio do povo”, parafraseando Marx. Lembro que quando disse isso para um atônito
Jota Parente (jornalista que foi meu chefe na Rádio Rural, quando comecei minha
carreira), recebi uma reprimenda por ter uma postura que ele considerava tão
radical. Mas apesar de ter esse pensamento, em época de Copa, nunca deixei de
acompanhar freneticamente os jogos, e quase sempre torcendo para o Brasil. Não
mudei minha concepção, apenas me entorpeço dela...
Teve copa - e das boas - apesar dos BB... |
Creio que não perdi a essência de
me rebelar, de me indignar, de criticar aqueles que saíram dos trilhos. Tento
manter acesa a chama do socialismo que acredito, mesmo que ele não seja pra mim
aquele mais utópico. Hoje tenho críticas ao governo do PT, mesmo estando filiado
a um partido que é seu principal aliado (PC do B). O PT no Pará, então, esse já
não existe, principalmente depois da patuscada de apoiar os Barbalho e Lira
Maia para o Governo do Estado (e o PC do B junto).
Sei que a CBF é corrupta e a Fifa
também. Mas todos queriam que o evento Copa viesse pra cá. O problema é que os
tucanos não conseguiram a proeza, e não aceitam o fato de não estar no poder.
Com certeza se estivessem, grande parte da mídia estaria favorável à Copa.
Quanto aos “radicais” de esquerda e seus black-blocks... ali não há cheiro de
povo, apenas uma maioria de jovens rebeldes que aproveitaram para levantar as
mesmas bandeiras dos tempos da ditadura... É desse proselitismo político que eu
quero sair.
Três gerações torcendo pela Grécia na Copa 2014 |
Este ano torci pelo hexa do
Brasil e por uma boa performance da Grécia, minha segunda Pátria (a primeira foi
fraca no início e acabou goleada de forma vexatória, já a segunda começou
goleada e se despediu de forma mais honrosa nas oitavas de final...). Assisti aos jogos da Grécia, alguns deles acompanhado de meu velho pai Georgios Ninos e de meu filho Georgios Ninos Neto, os solitários torcedores helênicos de Santarém (foto ao lado)...
Enquanto
assistia a noticiários na TV sobre manifestações e via as postagens de muitos
amigos da esquerda detonando a Copa, preferi fazer outra leitura deste momento.
Daí, a necessidade de escrever minhas reminiscências sobre as Copas que vivi
para poder justificar porque torci pela Copa e não contra ela.
Seleção colorida em 1974
Pela primeira vez uma final de Copa
caiu no dia do meu aniversário. Quando nasci há 51 anos, já era bicampeão e nem
sabia. Em 1966, tinha apenas três anos, mas nem me dei conta que a seleção se
deu mal na Inglaterra. Assim, a mais antiga lembrança que tenho de uma Copa do
Mundo é vaga, e resume-se a fogos de artifício pela conquista do tricampeonato,
além daquela música “chiclete” (“Noventa milhões em ação, pra frente Brasil...”).
Eu tinha sete anos e lembro da comemoração em casa. Mas é só. Não lembro das
imagens de TV ou de gols. Acho que a Copa era algo sem qualquer importância naquele
meu mundinho.
O Manoel Pinto visto da Praça da República em Belém |
A paixão pela Copa surgiu quatro
anos depois e foi justamente por causa do fascínio pela TV, que para mim era
algo bem próximo. Explico: eu morava com a família no 24º andar do edifício
Manuel Pinto da Silva (foto ao lado) – que à época era considerado o maior espigão da Amazônia
– e o andar de cima era ocupado pela TV Guajará que era a afiliada da Rede Globo em Belém (anos depois, a recém-criada TV
Liberal assumiria a Globo, na capital paraense).
Eu brincava nos corredores do 25º
andar e acabava sendo convidado a conhecer as coxias dos estúdios onde se
produziam os programas locais, principalmente o jornal da noite que era a
edição local do Jornal Nacional. Mas não assistia nada ao vivo. Ficava
fascinado quando assistia ao jornal da noite, e em seguida saía com a família
para uma volta na Praça da República e dava de cara, no elevador, com aquele
homem de paletó que eu acabara de assistir na TV. Talvez ali começasse a nascer
em mim uma vontade de um dia ser jornalista.
Mas voltando à Copa de 1974,
naquele ano seria a primeira vez que a Globo exibiria os jogos em cores. TV
colorida ainda era uma novidade e pouca gente em Belém tinha uma, mesmo uma
família de classe média alta como a minha. Pra nossa surpresa, a direção da TV
Guajará resolveu convidar todos os vizinhos do 24º andar para assistirem ao
jogo de abertura da Copa da Alemanha que seria entre o então tricampeão Brasil
e a Iugoslávia (hoje dividida em Croácia, Sérvia e Montenegro, Bósnia e
Herzegovina, Macedônia e Eslovênia).
Fiquei estupefato. Pirei. Naquele dia
decidi que não deixaria de assistir as próximas Copas. Colecionei até álbuns de
figurinha! Sabia escalações de seleções, fazia análises de resultados, somava
pontos e gols para ver quais se classificariam! Mas era algo meticuloso e
científico. Curiosidade de um futuro jornalista e não apenas deslumbre de um
pequeno torcedor. Mas como era ruim de bola, me tornei um craque no jogo de botão, onde montava times invencíveis com os craques da Copa!!! fiquei tão bom, que passei a fazer times com tampinhas de Whisky que juntava na rua ou umas medidas de leite em pó Mococa, que era a minha seleção imbatível!
O envolvente "Carrossel Holandês" de 1974. |
Da Copa de 74 não esqueço de duas
coisas: o belo gol do Rivelino na antiga Alemanha Oriental, numa falta batida
pra cima da barreira, onde o Jairzinho estava infiltrado e se jogou no chão
abrindo uma brecha. A jogada foi diversas vezes imitada e até hoje cria aquele
empurra-empurra nas barreiras. A outra coisa foi a bela seleção holandesa, o
chamado “Carrossel Holandês” que atropelou o Brasil com seu jogo coletivo de ir
e vir para o ataque e para a defesa, na quartas de final. Mas a “Laranja Mecânica”
como também ficou conhecida aquela seleção acabou perdendo na final, para
a então ensossa e sempre eficiente Alemanha, dona da casa. Eu era fã Cruijf (o
Robben é brilhante no atual time que também goleou o Brasil e ficou com o
terceiro lugar, mas não se compara com o mestre holandês de 1974)!
A copa em videotape
Quatro anos depois eu e minha
família nos transferíamos para uma tal de Santarém (eu nem sabia o que era essa
cidade. Hoje não sei se poderei um dia viver longe dela....). Ao chegar aqui
descobri que ainda não havia um canal de TV! Tragédia! Como eu assistiria a
Copa que aconteceria na Argentina? Mas a TV Tapajós já estava vivendo sua fase
experimental. Só que ainda não podia exibir imagens via satélite. Assim, a
gente acompanhava os resultados pelo rádio e no dia seguinte assistíamos o jogo
em vídeo-tape!
A TV Tapajós inaugurada em 1979, mostrando a Copa da Argentina em videotape |
Meu pai montou sua famosa
lanchonete Nino-Lanche no centro comercial. Atraiu boa freguesia e conheceu um
empresário que tinha um cinema, o velho Cine Acácia, na avenida São Sebastião
com Moraes Sarmento. Convidou-o para tomar conta da lanchonete que montou ao
lado, o Acação. E lá fui eu trabalhar às tardes e ouvir o jogo pelo rádio em
volume alto no bar do seu Caixeirinho, pai do advogado Wilton Dolzanis. A
música chiclete era “corrente 78, o ano da nossa seleção...”
Foi quando comecei a acreditar
que uma Copa podia ser arranjada: o Brasil era a melhor equipe e terminou
invicta em 3º lugar, mas a Argentina precisava ganhar por conta de interesses
da ditadura local. E o Peru levou uma surra dos Hermanos, deixando o Brasil
fora da final que aconteceria com o pessoal do “Carrossel Holandês” de novo! E
prevaleceu o joguinho catimbado da Argentina, que acabou erguendo a taça em
plena ditadura Argentina.
O futebol da filó-filosofia
A maior geração de craques que o
Brasil possuiu foi a do início dos anos 1980. O País vivia o final de uma
ditadura e ia pras ruas em busca de um Brasil melhor. Eu começava a militar nos
movimentos sociais e apesar de criticarmos o aparato da Copa, no fundo
torcíamos por um sucesso da seleção. Lula era nossa referência e o PT surgia
como esperança. Assim como Telê Santana, o técnico que comandaria as seleções
de 1982 e 1986. Ele tinha jogadores maravilhosos como Zico, Sócrates, Falcão,
Éder, Júnior, Casagrande, Alemão, careca e tantos outros craques que encantavam
qualquer um.
Telê era um turrão, como a maioria
dos técnicos brasileiros, mas empolgou apesar de eliminado nas duas copas por
falhas bobas nas oitavas de final. Em 1982, na Espanha, quando só precisava de
um empate com a Itália deixaram um tal de Paolo Rossi solto e ele acabou
fazendo três gols. O Brasil fez só dois voltou pra casa. Em 1986, no México,, o
algoz foi a França de Platini, que nos venceu nos pênaltis, mas acabou indo
decidir o terceiro lugar e perdeu.
A música que mexeu com minha
geração na década de 1980 foi a da Copa de 1982, até hoje um primor de letra
num belíssimo frevo, feita pelo baiano Moraes Moreira. “Tá lá, tá lá, tá no
filó, tá na filosofia, o craque brasileiro tem sabedoria! Tá lá!”. Me lembro
que bebi todas (acreditam?) no 4 x 1 do Brasil contra a Escócia e quase furava o
vinil em compacto que não parava de rodar na vitrolinha de casa! (clique no link acima para escutar a música). Havia ainda as do "Mexe, mexe, coração", de um personagem criado pela Globo, o tal
de Araken... mas apesar de engraçadinhas, não barravam o frevo de Moreira.
O fiasco de Lazaroni assistido na
Grécia
Em 1988 tive que sair de
Santarém, pois havia mexido com gente grande e não demoraria virar presunto. Um
autoexílio de três anos na terra de meu pai, a Grécia. De lá, acompanhei o
fiasco da seleção de Lazaroni em 1990, que perdeu nas oitavas de final para a
Argentina, de Maradona, que perderia na final da Alemanha, como agora no Brasil.
O interessante desta copa foi o
inusitado convite que recebi do radialista Olympio Guarany, que montava uma
equipe de 10 radialistas para cobrir a copa pela Rádio Rural. Eu seria o 11º da
equipe com a incumbência de cobrir o que aconteceria fora dos estádios. Foi
quando comecei a estudar todos os mundiais, comprando enciclopédias e
almanaques, para não fazer feio. Mas a utopia de Olympio se acabou no Plano
Collor, que confiscou a poupança dos brasileiros no início de seu desastroso
governo que cairia dois anos depois...
A música que recordo era a tal de
“Papa essa Brasil...” uma alusão à Copa na Itália, próximo ao Papa... sem
graça.
O tetra na terra do Tio Sam e o
fiasco na França
Já de volta ao Brasil, acompanhei
outra Copa, a dos EUA com um time que tinha muitos craques e muita arrogância.
Com Romário – apesar de gênio – à frente. Empolgou com um jogo meio fechado do
calado Parreira. Foi ano do nascimento de meu filho Georgios. Ele de fraldas no
meu colo, não entendia toda aquela gritaria e chorava (assim como Nicole chorou
agora). Bebeto fez o gol embala nenê, assim como eu embalava meu molequinho...
Bebeto e o Embala Nenê... |
A vitória conquistada 24 anos
depois do Tri de Pelé fez com que o Brasil perdesse a humildade. Acho que
depois daquela Copa começamos a viver de improvisos em busca de uma hegemonia
no futebol que já havíamos perdido. Uma Copa conquistada em pênaltis depois de
um ensosso 0 x 0 com a Itália de Baggio, que aliás nos deu a taça ao errar seu
chute. O Brasil vivia a euforia do Real e os tucanos se aboletavam no poder com
FHC. E a música da Copa passou a ser hino exclusivo da Globo, que só vem
mudando a letra desde lá de tetra pra penta e de penta pra hexa...
Chegamos à França em 1998
acreditando que nos bastava um Ronaldinho para acabar com tudo. Fomos até bem e
chegamos à final com os donos da casa, até à estranha convulsão do craque no
dia da final e a surra dos franceses comandados por Zinedine Zidane. Teorias de
Conspiração começaram a ser tecidas, mas nunca confirmadas: o Brasil entregou o
jogo? Apesar da derrota, FHC bateu em Lula de novo na reeleição que ele
garantiu com o Congresso Nacional.
O penta da redenção e o hexa que
não chega
Madrugar para assistir jogos do
outro lado do mundo. Uma rotina diária em 2002, numa Copa na Ásia (Japão e
Coreia do Sul). Mas valeu as horas sem sono. O time encantou. Felipão convenceu
como paizão. E a final com a Alemanha foi uma coisa do outro mundo. Éramos soberanos,
mas a lição que deixamos aos alemães eles aprenderam e doze anos depois vieram
nos devolver a derrota (com juros e correção monetária de 7 por 1...) aqui na
nossa casa.
FHC recebeu os “heróis” na rampa
do Planalto com direito a cambalhota sem jeito de um Vampeta embriagado. Se o
Brasil tava com tudo, o real já não bastava e os tucanos acreditaram que com
Serra dariam outra surra no PT. Lula levou a melhor...
O ridículo corte de Ronaldinho no penta |
Do penta para o hexa parecia um
pulo. Em 2006, na Alemanha, paramos novamente na França de Zidane nas oitavas
de final. Em 2010, a escalação de Dunga para técnico na África do Sul já era o
prenúncio de catástrofe, que acabou no jogo contra a Holanda com direito a
frango de Júlio César e expulsão ridícula de Felipe Melo. No Brasil, apesar
disso e do início da trama chamada Mensalão na qual o PT se envolveu e a mídia
insuflou, Lula se reelegeu.
E Lula foi buscar o direito de
sediar uma Copa no Brasil 64 anos depois do “Maracanaço”. A euforia foi geral.
Parecia que o hexa era detalhe. Lula elegeu Dilma, que seria a “gerentona”
desse projeto. O que se viu de lá para cá foi muita trapalhada, mas talvez com
muito exagero da imprensa que não aguenta mais o poderio lulo-petista. Acabar
com a Copa parece ter sido a última bala na agulha para evitar o quarto mandato
do PT à frente do governo. Muitos tucanos torceram pela derrota da seleção,
para derrotar Dilma. Mas será que isso acontecerá? Hoje já é possível antever
que pelo menos deve haver um segundo turno, mas o resultado da Copa não será
definitivo, como não foi em outros anos, para o desfecho final.
O futuro do futebol brasileiro
O futebol virou um grande negócio
e a multinacional que lida com isso é a Fifa. A próxima Copa será na Rússia,
mas se a política interna do futebol continuar como hoje (o que é razoavelmente
possível), só se pode esperar um novo fiasco e a consagração do projeto alemão
de se tornar penta e quem sabe chegar ao hexa antes de nós. Será que os atletas
do Bom Senso Futebol Clube conseguirão passar suas propostas? Eles já denunciam
que a máfia na CBF continua.
Daqui a quatro anos estarei
novamente à frente de uma TV, palpitando, torcendo, mas sem aquela coisa
ufanista de cantar o hino em época de Copa. Precisamos “desimbecilizar” o
sentimento patriótico de quatro em quatro anos. Acho que o Brasil já pendurou,
este ano, a tal de “Pátria de Chuteiras”. Precisamos voltar ao futebol descalço
das várzeas e periferias, com um governo que avance ainda mais nas questões
sociais.
E que o terrível 7 x 1 seja um novo
começo do futebol brasileiro...
P.S. Esse texto começou a ser escrito antes da Copa iniciar, mas os afazeres com Nicole foram adiando o fechamento do texto. Acabei parando e resolvi lançar como texto de aniversário, como faço todos os anos. Mas um problema com meu computador me impediu de postá-lo no sábado, depois de mais um fiasco do Brasil. Acabei tendo que atualizá-lo, para postá-lo hoje.
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