A voz no celular, direto de Roraima, confirmava a vitória de um projeto que, a princípio, poderia ser apenas mais um trabalho acadêmico ganhando um troféu (foto acima) num congresso estudantil. Mas a conquista do prêmio de melhor trabalho na categoria “jornalismo impresso” para o jornal experimental “CidadeMídia” da 1ª turma de graduação em Comunicação Social de Santarém, é muito mais que isso. Não só para os 30 acadêmicos que participaram do processo de elaboração, mas, historicamente (um dia isso será reconhecido) é a consolidação de um sonho que o próprio nome do jornal carrega em si.
Estou falando do Intercom Norte/2008, que aconteceu em Roraima e que pela primeira vez teve um trabalho de estudantes de jornalismo de Santarém concorrendo com outras faculdades. E no final, a vitória com direito a representar a região norte no Congresso do Intercom Nacional, que acontece de 02 a 06 de setembro de 2008, em Natal (RN). Intercom é a sigla da Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação que há 30 anos reúne jornalistas, pesquisadores, professores e acadêmicos de jornalismo para debater os rumos dessa nobre profissão. O crescimento da entidade incentivou a realização de congressos regionais e dá oportunidade para que os acadêmicos apresentem trabalhos realizados em seu cursos, numa mostra paralela chamada Expocom. Não há prêmio em dinheiro, mas o trabalho recebe o reconhecimento da academia e fica registrado nos anais da Sociedade.
Mas o que pode haver de especial num jornal experimental feito por acadêmicos de uma faculdade? No caso de Santarém, como o título do jornal sugere, não é somente um nome, mas um conceito que começamos a debater na faculdade: como explicar uma cidade com tanta gente que vive da comunicação há mais de século e meio e que hoje ocupa o espaço em 5 emissoras de rádio, 7 canais de TV e cerca de 10 semanários com produção local? Santarém é uma verdadeira “cidade-mídia”, conceito que começou a ser defendido pelo jornalista Manuel Dutra e que foi assimilado pelos alunos do curso que ele coordenou por dois anos.
Mas chegar ao prêmio e almejar até um reconhecimento nacional, não foi fácil. Foram várias etapas de sofrimento desde a produção até a defesa do trabalho no congresso, mesmo tendo entre os estudantes pelo menos um terço de colegas com alguma experiência na comunicação local. Como eu, tantos outros sofreram para produzir um jornal em formato tablóide com 24 páginas. Dutra dividiu-nos em seis editorias, colocando cada um dos mais experientes como editor. E o que parecia que seria fácil, revelou-se um tormento. Afinal, apesar da experiência acumulada, era preciso reciclar conceitos e cortar vícios.
As equipes foram às ruas, coletaram as informações e os textos passaram por um processo inicial de revisão. Depois de prontos, novos cortes ou simplesmente a ordem para fazer tudo de novo. Depois dos textos serem aprovados, fizemos uma diagramação coletiva em sala de aula, com a imagem do computador refletida no data-show. Um mês depois, estava pronta a criança saindo do prelo de uma gráfica e lambida como cria pelos 30 "pais". Dutra, o "avô-babão", com olhar enternecido também via um sonho se realizando.
Mas nem tudo eram flores. O jornal foi feito no 3º semestre do curso e só poderia concorrer no Intercom deste ano. Em janeiro, Dutra deixa o curso e seu substituto, um jovem professor sem experiência e de idéias equivocadas, quase põe tudo a perder. Em pé de guerra com todos os alunos ele acaba tendo que sair, não sem antes tentar sabotar nosso trabalho, que sequer foi indicado à direção do Intercom!
Perdemos o prazo da inscrição por causa disso, mas fizemos um apelo por e-mail à coordenação do evento explicando a situação que vivíamos. Enquanto a direção do encontro estudava nosso caso, eis que reabrem-se os prazos para novas inscrições! Não perdemos tempo e conseguimos que a coordenadora pro-tempore da faculdade fizesse aquilo que o coordenador demissionário não fizera. Agora estávamos a um passo do prêmio, certo? Errado, no meio do caminho havia um sistema on-line que não funcionava direito. Nós, como outros acadêmicos do norte, não pudemos registrar nossos trabalhos para concorrer ao prêmio. Frustração...
Após vários protestos por e-mails a coordenação, sensibilizada, consegue a tempo recuperar o sistema e voilá: o “CidadeMídia” aparece na lista dos concorrentes!
Começa então a organização da caravana, mas os altos custos da viagem e outros problemas pessoais, reduzem nosso grupo de 30 para apenas 3! Tudo bem, bastam poucos para defender o trabalho. Às vésperas da viagem, o sistema não registra mais nosso trabalho! Contatos telefônicos e mais protestos. Para completar, mais dois desfalques na equipe de viagem e a única colega apta a viajar segue sem ainda ter certeza se o trabalho será liberado. Até que um dia antes, lá está o “CidadeMídia” novamente na lista... Ao que parece problemas tecnológicos insistiam em nos dar sustos...
Albanira Coelho, jornalista e acadêmica segue sozinha, deixando 29 corações pulsando por aqui. Mas as desventuras do “CidadeMídia” ainda não haviam acabado...
O avião que leva nossa representante à Roraima não passa de Manaus. O mau tempo cancela os vôos e Albanira perde um dia do encontro, exatamente o momento de defender o trabalho! Pelo jeito não era nosso dia. Mas ao chegar em Roraima, corre ao local do evento e descobre que foi aberta nova oportunidade aos acadêmicos que tiveram problemas com o vôo de Manaus. Só que a exposição tinha que ser naquele lugar dentro de alguns minutos! Mas as bagagens ficaram no hotel! Albanira tenta ligar através de celular para que lhe tragam o material. O celular não tem crédito. “Me empreste seu celular”, diz ela a outra colega ao lado e consegue em poucos segundos que alguém se responsabilize em trazer o material, que chega com o prazo quase esgotado.
Na “arena”, a jornalista se vê sozinha com a claque de várias faculdades. Anunciada como sendo de Santarém/Pará, recebe a solidariedade de colegas de Belém. Faz a apresentação e sai do local com a impressão de que se saiu bem. No dia seguinte, seguindo a programação, chega ao local do enceramento para saber se o trabalho foi premiado. Mas a programação foi adiantada e já estão entregando os últimos prêmios. Acanhada, sem saber se ganhamos ou não, senta-se no fundo da platéia até que alguém lhe diz que logo no início chamaram alguém de Santarém que não compareceu!! Tremendo, Albanira se aproxima do coordenador e pergunta “que tal o CidadeMídia?”. E ele apenas diz: “Parabéns! Suba aqui e receba o prêmio!” A claque aplaude e Santarém está no podium. O troféu é nosso!
Para nós não é uma vitória da nossa turma, nem da nossa faculdade, mas uma vitória do jornalismo que se pratica nessa CidadeMídia chamada Santarém, e que ainda vai gerar outros capítulos...
Natal, aí vamos nós...
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(*)Artigo inserido em minha coluna semanal Perípatos publicada em 27.06.2008, no Diário do Tapajós, encarte regional do jornal Diário do Pará.
2 comentários:
Fico feliz em fazer parte desse grupo de papis e mamis que botaram a cria pra foram e já foram arrebatando um prêmio como esses.
E outros e outros virão.. e apesr de todo o esforço da tua parte e da ‘velha infância’ ( leia-se os experientes) da nossa turma, pode deixar que o próximo banho na criança fica por conta dos focas!!
Forte abraço!
Jota,
eu sabia das dificuldades, mas não imaginava que tinha chegado a tanto. Uma dica: o Expocom não é um evento paralelo, mas integra os certames da Intercom, destinado a estudantes de graduação.
Acabo de passar os olhos no CidadeMídia, relembrando aquela aventura trabalhosa mas que dá saudade. Cada vez que revejo, percebo que, a despeito da pressa e das improvisações (o que é normal na atividade) com que foi feito, os textos são muito bons e as fotos tb. Poderia ter sido melhor. Há problemas, mas acredito que no Intercom Nacional ficará entre os melhores. Não sei quem vai julgar, então é esperar.
Manuel Dutra, por e-mail.
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