quinta-feira, 25 de outubro de 2007

Crônica de um santareno em Macapá

Publico hoje a crônica que me foi enviada pelo amigo Hamilton Fernandes, professor santareno que vive em Macapá e que é um fiel leitor do blog.
Desculpem-me pelo atraso na publicação, mas nesse blog é assim: um dia a coisa sai!


Í r i s

Caminhando por linhas tortuosas, saltitando erupções, mesclando ao suor o pó das minhas ruas. O visco que fica tem o cheiro da minha cidade. Cheiro de povo, o que às vezes não é nada agradável. Sempre, porém, é a cidade entranhada em mim, entre a derme e a epiderme, sem chance de sair com um simples banho de chuveiro.
À medida que os passos caminham por si, paisagens várias se me acumulam os olhos, cenários vários. E minha menina passeia feliz pelos brinquedos rotos das praças, pela relva queimada, tufos castigados de sol do santo dia, pelas ruelas e becos estranhos e solenes. Os paralelepípedos das ruas (inexistentes, a não ser em meus devaneios poéticos) ferem os pés.
Mas a menina não liga. Íris é seu nome, e ela passeia, me levando a conhecer a cidade que já conheço. Sem ela sou cego. É ela quem observa os sinaleiros, as placas, os carros. Ela é quem me atravessa a rua após olhar os dois lados, como aprendi com a professora de infância. Usa-me como linha a costurar ruas tortas, becos mínimos, calçadas sem calçadas da minha cidade.
Ah! menina, mostra-me a cidade como quem o faz a um turista daqui mesmo. Mostra-me a cidade minha, que já conheço e que está tão em mim amalgamada.
É esta, a de linhas tortas e horizontes levemente arqueados. De rios que não se misturam por medo de perder sua identidade. De ilhas flutuantes que sempre crescem mais e mais, e se multiplicam e se proliferam...
O cheiro de povo vem de novo. Exala dos cascos das embarcações, das praias mortas a beira-rio, dos costumes e crenças de cada esquina, do concreto do cais do porto.
Barracas de peixe frito ao lado de sub-MacDonalds lembram minha alma de moleque, estranho moleque que não soltava pipa, não brincava gude ou pião, não esquadrinhava as ruas com a turma barulhenta, mas que já naquela época tinha sede de liberdade. Mesmo sendo uma liberdade presa no terreno grande de casa, imensa prisão disfarçada de mundo.
A cidade que conheci estava ali. A que me mostra agora minha menina é outra e a mesma, estranha e íntima como a segunda namorada, que da primeira não tenho lembranças.
Minha cidade em mim entranhada é corpo estranho em meu próprio corpo, é corpo largado nas ruas mais perigosas, nos cantos mais escuros. É corpo virgem a quem são mostrados os discretos motéis de beira de estrada. Corpo suado de correr na orla, de malhar no meio-fio. Corpo de prazer. Corpo de delito.
Minha menina é sábia. A cidade que me mostra é aquela que já sei. A das boates da noite, bares da vida em cuja mesa de pano verde às vezes passo meu tempo. E ela, a minha menina, me auxilia a encaçapar bolas, a namorar meninas outras já da vida, a sentir o prazer de olhar de perto (com auxílio de mãos e dedos e outras partes do corpo) tantos segredos semi-escondidos, semimostrados.
Menina sem corpo, que me pertence. Cidade sem porto que me prende. Paixão sem rosto que me atende os desejos mais vis, mais abjetos, mais sublimes. Toma minha frente, menina. Leva-me atrás de si a descobrir de novo minha cidade. A visitar seus portos e suas tendas, seus luares e lupanares. Pores-de-sol. Os lugares que não conheço, os que conheço e não uso, por medo talvez, ou vergonha, de que percebam que não sou daqui.
A cidade que me desconhece me esconde em si, e há tantos lugares, tantos desencontros marcados em suas esquinas, em seus velhos casarões do Centro, que nem centro é, é frente (estranha cidade em que a frente é centro, o centro é periferia e a periferia é mato, ou outra cidade).
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De repente me vejo, eu e minha menina, em outro cenário, outra cidade. Esta não é minha, nunca foi. Para um paraense de Santarém não existe outra cidade. Só há o brilho da Pérola do Tapajós em meio às águas do grande rio. Sinto falta das suas praias de rio, limpas de águas e de branco areal.
Minha menina já não me leva a passeio. Parece cansada. Na verdade, creio que é saudade da nossa cidade, onde éramos livres e à qual estávamos presos. Mas agora estamos aqui, embora não haja Fortaleza de São José que se compare às paredes em ruínas do nosso Castelinho.
Nesta cidade, nomes como “Çairé”, “Borari”, “Alter-do-Chão” e “Encontro das águas” soam estranhos. As raízes são outras, os nomes também. Zerão, Marco Zero, Fortaleza. A Cidade do Meio do Mundo pulsa cheia de vida, mas fico trancado, eu e minha menina, contemplando as paredes brancas e os labirintos de teia que formam mandalas nos vãos do teto. Os tambores no meio do mundo chamam ao requebro, o marabaixo estende seu balanço pelo mar inteiro, rio inteiro e suas margens. Mas eu nunca fui de dança. E o trapiche só traz saudade de outro, mais famoso e querido porque já não existe senão na lembrança dos antigos santarenos. A cidade não é minha. Quisera que fosse.
Fosse minha, mandava ladrilhar com minhas lembranças felizes da cidade minha outra. Fosse minha, não sofreria tanto pela falta de areia branca das praias de verdade, nem pela falta de todas as pequenas coisas que me deixaram marcas indeléveis. Não sentiria a saudade que advém do cheiro de maresia entranhado nas embarcações ao longo do rio, nem a falta das serenatas nas noites enluaradas da minha terra.
Do meu quarto, entre paredes brancas e teto de barro, com a visão presa no emaranhado cintilante das teias caleidoscópicas, quedamos eu e minha menina, sozinhos, saudosos de outras terras, de outros momentos. Vem, menina. Para melhor suportar essas horas de solidão, deixa eu te envolver, abraçar com a minha pele, sentir teu toque escorregadio, lubrificado. E sonhar recordações.
Por que nessas linhas carregadas de palavras incestuosas, de laços impróprios entre um homem e sua menina, um simples fechar de pálpebras mitiga um pouco a saudade.
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Minha menina (Íris é seu nome) está entranhada nesses olhos que brilham agora por trás das lentes míopes de meus óculos...



(Crônica contemplada com menção honrosa no I Concurso Literário “Macapá com todas as Letras”, de 2006)

Eleições: os “bois de piranha” e os “Ó’s do borogodó” (*)

Volto a escrever a coluna depois de quase um mês inativo por conta de compromissos profissionais. E toco no assunto que vai começar a ganhar espaço na mídia: a preparação dos partidos para as eleições do próximo ano.
Sexta-feira, 05 de outubro, foi o último prazo para mudanças de partidos para quem pretende se candidatar a uma vaga nas próximas eleições. Houve muito troca-troca local e participei de um debate neste final de semana (06/10) no blog do jornalista Jeso Carneiro, após ver o comentário de um internauta anônimo criticando a informação de que radialistas de Santarém estariam se filiando em vários partido na busca de uma vaga nas próximas eleições.
Discordei da “raiva” do internauta anônimo com os candidatos que trabalham em rádio. A questão não é ser radialista ou não. A questão é saber se suas intenções como candidatos são boas ou se querem ser apenas mais um político demagogo. Afinal, nossa Constituição garante o direito de qualquer cidadão votar e ser votado, preenchidos os requisitos básicos. O próprio anônimo, quem sabe, pode ser um talento da política que ainda não foi descoberto...
Mas afirmo de cátedra que todos deverão ser apenas “bois de piranha” nas próximas eleições, com poucas chances de conquistar uma vaga, mas ajudarão a eleger grande parte dos mesmos de sempre. Acho que todo mundo conhece a expressão “boi de piranha”, que vem de um costume de peões do Pantanal: quando uma boiada precisa atravessar um rio infestado de piranhas, os peões ferem um dos bois e atraem as feras sacrificando o animal - que geralmente é o mais velho do gado – e atravessam a salvo o resto da boiada num ponto mais afastado do rio.
Numa eleição, os astutos “reis do gado” (os donos dos partidos, mas nem sempre donos dos votos) usam de estratégia quase idêntica para garantir que sua manada se dê bem na disputa pelos votos. A diferença é que neste caso o “boi de piranha” é escolhido não entre velhos militantes do partido e sim entre pessoas sem experiência política, mas que tem alguma visibilidade na comunidade. De preferência, pessoas que alcançaram a fama através da mídia como radialistas, atletas ou artistas.
Outra diferença é que o “boi de piranha das eleições” atrai eleitores incautos para sua “carne fresca” e o partido ganha em troca o chamado “quociente partidário” (baseado no “quociente eleitoral” que define a tal proporcionalidade) e acaba conquistando mais vagas para a sua bancada (mas à frente tento explicar essa lógica). Às vezes, algum “boi de piranha” consegue se salvar, atravessa o “rio das eleições” e nada até às tranqüilas praias chamadas de “plenário do Legislativo”...
Essa situação já começa a se delinear a um ano das eleições como bem sugere matéria jornalística do portal G1 da que mostra as novas filiações de celebridades pelos partidos em nível nacional para as próximas eleições. E Santarém não fica atrás nessa onda.
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Os “Ó’s do borogodó” - Os únicos radialistas que conseguiram a façanha de conquistar um mandato na recente história da Câmara Municipal de Santarém foram Oti Santos e Osvaldo de Andrade.
Ele foram os verdadeiros “Ó’s do borogodó” de sua época: dois jovens “galãs” do rádio santareno que entraram na política no final dos anos 1970 e início dos anos 1980, passando pela Câmara Municipal e se firmando como políticos e ainda hoje como radialistas de sucesso, apesar dos altos e baixos em suas carreiras políticas (atualmente, mais baixos do que altos).
Os dois representavam (pelo menos aparentemente) duas posturas ideológicas distintas naquele período, além de rivalizarem o mesmo espaço no âmbito da locução esportiva. Mas os tempos eram outros: a cidade era mais provinciana que agora e a Rádio Rural (onde os dois atuavam) tinha uma quase absoluta audiência. Convivi de perto com os dois, como repórter e como colega de profissão e acho que posso me arriscar a delinear seus perfis.
Osvaldo era o projeto dos sonhos de liderança pró-regime militar sob as asas do então PDS de seu pai, Agapito Figueira (o velho líder comunitário da antiga Arena, partido dos militares). Eleito vereador para o período 1983/1988, Osvaldo retornou à Câmara só em 2001/2004 e atualmente é suplente de vereador. Mas decepcionou seu pai quando largou o PDS pelo PMDB, passou pelo PTB e hoje está no PSDB para tentar retornar à Câmara em 2008.
Já Oti Santos vinha de raízes baratistas (seu pai foi um “soldado” de Magalhães Barata, o “pai dos pobres” ao tucupi) e pretendia ser a antítese do regime militar pelo PMDB, remanescente do antigo PSD. Politicamente foi mais bem sucedido que Osvaldo, pois além de vereador foi deputado estadual e prefeito de Belterra por duas vezes e nunca trocou de partido. Hoje sonha em voltar à prefeitura de Belterra, mas ao que parece vai viver o pesadelo de comandar a Cosanpa...
Cito o exemplo dos dois para reafirmar que nos dias de hoje é mais difícil um radialista ou jornalista conseguir um espaço na política do que naquela época. Acompanho a votação de Santarém nos últimos 25 anos e constato que, no geral, esses profissionais têm uma votação pífia ou quando muito, conseguem uma boa projeção em votos mas não o suficiente para se eleger (eu mesmo já fui candidato em 1992 e senti isso de perto).
Outro fator que contribui para que os radialistas não obtenham esse sucesso na votação, está na pulverização de seu eleitorado. Algumas pessoas podem até votar num candidato pelo seu desempenho como profissional da comunicação, mas se houver vários candidatos essa audiência se dividirá entre os vários candidatos.
Segundo minhas anotações, o número de candidatos ligados à órgãos de comunicação vem diminuindo substancialmente. A maior leva de candidatos foi na eleição de 1992 quando cerca de 20 profissionais da imprensa tentaram uma vaga na Câmara Municipal. O mais votado naquele ano foi Osvaldo de Andrade (que tentava a reeleição) e que acabou ficando de fora. Já na eleição passada (2004) esse número não chegou a 5 candidatos e mais uma vez o mais votado foi Osvaldo de Andrade, que só conseguiu uma suplência.
Muita gente até hoje não compreende a lógica da proporcionalidade das eleições. Ano passado escrevi uma série de textos aqui “Perípatos” que chamei de “Manual do Eleitor Incauto”, sobre este e outros temas relacionados às eleições (para ler esses textos clique AQUI, AQUI, e AQUI).
A coisa é complexa, mas quem já trabalha na política sabe como a engrenagem funciona. O problema são os milhares de candidatos novatos que são seduzidos à participar da campanha, alguns bem intencionados outros não, e que acabam servindo de “bois de piranha” nesta matemática confusa. Principalmente aqueles que se acham uma “celebridade”.
Tendo acompanhado duas campanhas municipais trabalhando com marketing e armazenando números de votos em um banco de dados próprio, acredito que a visibilidade que os nossos “artistas locais” possam ter no seu dia-a-dia numa emissora de rádio é apenas o que chamo de “potencial de partida” para impulsionar uma campanha.
Se não tiverem estrutura logística para se deslocar por todo o município e grupos de apoio nas comunidades e bairros para multiplicar esse potencial, serão apenas meros “bois de piranha” ajudando o partido a garantir o quociente para eleger as velhas figurinhas carimbadas da política.
E nunca serão um “Ó do borogodó”...
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(*) Artigo inserido em minha coluna Perípatos publicada em 09/10 no Diário do Tapajós, encarte regional do Diário do Pará. A "tentativa de charge" e de minha autoria sobre foto de divulgação do TSE.

Eleições: os “bois de piranha” e os “Ó’s do borogodó” (*)

Volto a escrever a coluna depois de quase um mês inativo por conta de compromissos profissionais. E toco no assunto que vai começar a ganhar espaço na mídia: a preparação dos partidos para as eleições do próximo ano.
Sexta-feira, 05 de outubro, foi o último prazo para mudanças de partidos para quem pretende se candidatar a uma vaga nas próximas eleições. Houve muito troca-troca local e participei de um debate neste final de semana no blog do jornalista Jeso Carneiro, após ver o comentário de um internauta anônimo criticando a informação de que radialistas de Santarém estariam se filiando em vários partido na busca de uma vaga nas próximas eleições.
Discordei da “raiva” do internauta anônimo com os candidatos que trabalham em rádio. A questão não é ser radialista ou não. A questão é saber se suas intenções como candidatos são boas ou se querem ser apenas mais um político demagogo. Afinal, nossa Constituição garante o direito de qualquer cidadão votar e ser votado, preenchidos os requisitos básicos. O próprio anônimo, quem sabe, pode ser um talento da política que ainda não foi descoberto...
Mas afirmo de cátedra que todos deverão ser apenas “bois de piranha” nas próximas eleições, com poucas chances de conquistar uma vaga, mas ajudarão a eleger grande parte dos mesmos de sempre. Acho que todo mundo conhece a expressão “boi de piranha”, que vem de um costume de peões do Pantanal: quando uma boiada precisa atravessar um rio infestado de piranhas, os peões ferem um dos bois e atraem as feras sacrificando o animal - que geralmente é o mais velho do gado – e atravessam a salvo o resto da boiada num ponto mais afastado do rio.
Numa eleição, os astutos “reis do gado” (os donos dos partidos, mas nem sempre donos dos votos) usam de estratégia quase idêntica para garantir que sua manada se dê bem na disputa pelos votos. A diferença é que neste caso o “boi de piranha” é escolhido não entre velhos militantes do partido e sim entre pessoas sem experiência política, mas que tem alguma visibilidade na comunidade. De preferência, pessoas que alcançaram a fama através da mídia como radialistas, atletas ou artistas.
Outra diferença é que o “boi de piranha das eleições” atrai eleitores incautos para sua “carne fresca” e o partido ganha em troca o chamado “quociente partidário” (baseado no “quociente eleitoral” que define a tal proporcionalidade) e acaba conquistando mais vagas para a sua bancada (mas à frente tento explicar essa lógica). Às vezes, algum “boi de piranha” consegue se salvar, atravessa o “rio das eleições” e nada até às tranqüilas praias chamadas de “plenário do Legislativo”...
Essa situação já começa a se delinear a um ano das eleições como bem sugere matéria jornalística do portal G1 da que mostra as novas filiações de celebridades pelos partidos em nível nacional para as próximas eleições. E Santarém não fica atrás nessa onda.
Os “Ó’s do borogodó” - Os únicos radialistas que conseguiram a façanha de conquistar um mandato na recente história da Câmara Municipal de Santarém foram Oti Santos e Osvaldo de Andrade.
Ele foram os verdadeiros “Ó’s do borogodó” de sua época: dois jovens “galãs” do rádio santareno que entraram na política no final dos anos 1970 e início dos anos 1980, passando pela Câmara Municipal e se firmando como políticos e ainda hoje como radialistas de sucesso, apesar dos altos e baixos em suas carreiras políticas (atualmente, mais baixos do que altos).
Os dois representavam (pelo menos aparentemente) duas posturas ideológicas distintas naquele período, além de rivalizarem o mesmo espaço no âmbito da locução esportiva. Mas os tempos eram outros: a cidade era mais provinciana que agora e a Rádio Rural (onde os dois atuavam) tinha uma quase absoluta audiência. Convivi de perto com os dois, como repórter e como colega de profissão e acho que posso me arriscar a delinear seus perfis.
Osvaldo era o projeto dos sonhos de liderança pró-regime militar sob as asas do então PDS de seu pai, Agapito Figueira (o velho líder comunitário da antiga Arena, partido dos militares). Eleito vereador para o período 1983/1988, Osvaldo retornou à Câmara só em 2001/2004 e atualmente é suplente de vereador. Mas decepcionou seu pai quando largou o PDS pelo PMDB, passou pelo PTB e hoje está no PSDB para tentar retornar à Câmara em 2008.
Já Oti Santos vinha de raízes baratistas (seu pai foi um “soldado” de Magalhães Barata, o “pai dos pobres” ao tucupi) e pretendia ser a antítese do regime militar pelo PMDB, remanescente do antigo PSD. Politicamente foi mais bem sucedido que Osvaldo, pois além de vereador foi deputado estadual e prefeito de Belterra por duas vezes e nunca trocou de partido. Hoje sonha em voltar à prefeitura de Belterra, mas ao que parece vai viver o pesadelo de comandar a Cosanpa...
Cito o exemplo dos dois para reafirmar que nos dias de hoje é mais difícil um radialista ou jornalista conseguir um espaço na política do que naquela época. Acompanho a votação de Santarém nos últimos 25 anos e constato que, no geral, esses profissionais têm uma votação pífia ou quando muito, conseguem uma boa projeção em votos mas não o suficiente para se eleger (eu mesmo já fui candidato em 1992 e senti isso de perto).
Outro fator que contribui para que os radialistas não obtenham esse sucesso na votação, está na pulverização de seu eleitorado. Algumas pessoas podem até votar num candidato pelo seu desempenho como profissional da comunicação, mas se houver vários candidatos essa audiência se dividirá entre os vários candidatos.
Segundo minhas anotações, o número de candidatos ligados à órgãos de comunicação vem diminuindo substancialmente. A maior leva de candidatos foi na eleição de 1992 quando cerca de 20 profissionais da imprensa tentaram uma vaga na Câmara Municipal. O mais votado naquele ano foi Osvaldo de Andrade (que tentava a reeleição) e que acabou ficando de fora. Já na eleição passada (2004) esse número não chegou a 5 candidatos e mais uma vez o mais votado foi Osvaldo de Andrade, que só conseguiu uma suplência.
Muita gente até hoje não compreende a lógica da proporcionalidade das eleições. Ano passado escrevi uma série de textos aqui “Perípatos” que chamei de “Manual do Eleitor Incauto”, sobre este e outros temas relacionados às eleições.
Disponibilizo agora apenas o trecho que fala exatamente desta complexa matemática para definir quem ocupará as tão sonhadas vagas do Legislativo pelo critério da proporcionalidade definido após as eleições, como forma de auxiliar os pretensos candidatos:
“(...)Primeiro define-se os votos válidos, obtidos a partir da diminuição dos votos em branco e dos votos nulos do número total de votantes na eleição. Por exemplo, num estado, o número de eleitores que votaram é de 1.000. Destes, 50 votaram nulo e 100 votaram em branco. Os votos válidos serão 850.
Feito isso, define-se o quociente eleitoral através da divisão dos votos válidos pelo número de lugares a preencher (cadeiras). Por exemplo, nesse mesmo estado, existem 10 cadeiras na Assembléia Legislativa. O Quociente Eleitoral será 85. Aí, o próximo passo é definir o Quociente Partidário, que é obtido, dividindo-se o total de votos recebidos por cada partido ou coligação pelo Quociente Eleitoral.
Seguindo o exemplo dado, digamos que neste hipotético estado 03 (três) partidos disputaram a eleição, sendo que o partido A teve 450 votos, o partido B teve 255 e o partido C apenas 145 votos. A divisão das cadeiras será assim: Partido A, cinco cadeiras (450/85), Partido B, três cadeiras (255/85) e o Partido C, uma cadeira (145/85).
Por fim, vem a definição das vagas que sobraram. Aí, o número de votos válidos atribuídos a cada partido ou coligação, será dividido pelo número de lugares obtidos por ele mais um. Sendo que caberá ao partido ou coligação que apresentar a maior média um dos lugares a preencher.
Seguindo o nosso exemplo, vamos ver quem fica com a última cadeira, que não foi preenchida: o Partido A teve 450 votos, que divididos pelas vagas obtidas na primeira soma (5), é igual a 90, somado a 1 = 91. Já o Partido B teve 255 votos, que divididos pelas vagas obtidas na primeira soma (3) é igual a 85, somado a 1 = 86. Por fim, o Partido C com seus 145 votos, que divididos pelas vagas obtidas na primeira soma (1) é igual a 145, somado a 1 = 146. Assim, coube ao Partido C a última vaga(...)”.
A coisa é complexa, mas quem já trabalha na política sabe como a engrenagem funciona. O problema são os milhares de candidatos novatos que são seduzidos à participar da campanha, alguns bem intencionados outros não, e que acabam servindo de “bois de piranha” nesta matemática confusa. Principalmente aqueles que se acham uma “celebridade”.
Tendo acompanhado duas campanhas municipais trabalhando com marketing e armazenando números de votos em um banco de dados próprio, acredito que a visibilidade que os nossos “artistas locais” possam ter no seu dia-a-dia numa emissora de rádio é apenas o que chamo de “potencial de partida” para impulsionar uma campanha.
Se não tiverem estrutura logística para se deslocar por todo o município e grupos de apoio nas comunidades e bairros para multiplicar esse potencial, serão apenas meros “bois de piranha” ajudando o partido a garantir o quociente para eleger as velhas figurinhas carimbadas da política.
E nunca serão um “Ó do borogodó”...

quarta-feira, 24 de outubro de 2007

Madeireiro processa jornalista santareno

O blog, desativado há quase dois meses por conta de afazeres deste jornalista-escrivão, volta hoje para registrar mais um daqueles costumeiros casos de tentativa de colocar mordaça em profissionais do jornalismo que denunciam agressões ao meio ambiente.
A vítima da vez é o jornalista santareno, José Maria Piteira (foto), que escreve matérias para o Jornal de Santarém e do Baixo-Amazonas (JSBA), representante regional de O Liberal, onde também a matéria em questão foi publicada.
Piteira, que há anos vem trabalhando com assessoria de imprensa de prefeituras da região oeste do Pará, principalmnete da Calha Norte, tem denunciado (como free lance) as atividades de grupos interessados em "investir" na agricultura regional, com os velhos métodos de sempre.
Defesa - Factual, imparcial e não-ofensiva. Assim é apresentada a reportagem “Madeireira devasta Floresta do Paru”, publicada em O LIBERAL, no dia 01 de setembro passado. Esta também é a tese principal da defesa apresentada pelo jornalista José Maria Piteira, autor da matéria, em processo movido contra ele pelo madeireiro Juvenal Piovezan Ribas, de Monte Alegre. A acusação é de calúnia, com base na tristemente famosa “Lei de Imprensa”, que amordaçou o Brasil no período de 1964-1985. A reportagem relatou denúncias da Prefeitura e de líderes comunitários locais contra o madeireiro, confirmadas in loco pelo jornalista. O processo corre na 16ª Vara Penal do Fórum da Capital. O advogado Jarbas Vasconcelos cuida da defesa de Piteira.
O processo é claramente intimidatório. Piteira acompanha, como jornalista, as ações de madeireiros e grileiros no município de Monte Alegre, assim como as reações do poder público e de entidades civis locais, desde 2003. Mais de uma dezena de reportagens assinadas por ele já foram publicadas em jornais de Belém e da região, com reprodução em vários sites do Brasil. O JBSB publicou todas as reportagens do jornalista sobre o assunto.
Para ler a matéria que causou a celeuma clique AQUI. E para saber mais sobre o caso, pode ser feito contato direto com o jornalista pelo e-mail: jmpiteira@yahoo.com.br