quinta-feira, 21 de abril de 2005

Tiradentes2

Em homenagem à data de hoje, apresento no blog uma poesia que fiz em 1984, homenageando o líder sindical Avelino Ribeiro da Silva, morto numa tocaia por causa de uma briga pela posse de uma terra, na rodovia Santarém-cuiabá.

Avelino era delegado sindical do Sindicato dos Trabalhadores Rurais e o conheci em um encontro de lideres trabalhistas no Emaús. Era um sujeito bandalho, que destoava do clima sisudo dos “companheiros” da época e gostava de “aprontar” com todos durante o encontro, fazendo coisas do tipo esconder sandálias de Milton Peloso no congelador, jogar a minha rede no alto das árvores, dar nós nas redes de outros companheiros, etc...

Avelino era tão malandro que sempre levava consigo uma mala preta, tipo 007, cheia de “apetrechos profissionais” que ele usaria nas suas brincadeiras.
Nesse mesmo encontro, uma de suas “vítimas” foi o grande líder sindical na época (hoje prefeito de Belterra), Geraldo Pastana, que tinha um sono pesado... Avelino aproveitou uma das pestanas de Pastana (desculpem o trocadilho infâme), abriu sua “bolsa de maldades” e tirou de lá uma agulha e um tubo de linha de nylon.
Sorrateiramente, frente a uma platéia que se “espocava” de rir, COSTUROU O CALÇÃO de Pastana na rede sem que ele acordasse! Ficamos todos ali, sentados, olhando o desfecho do xiste. Resultado: Pastana acorda olha em redor seus companheiros. Se espreguiça e resolve se levantar, acreditando talvez que seu liderados o aguardam para mais um de seus inebriantes discursos....
Qual o quê! Ao tentar sair da rede, Pastana fica pendurado pelo calção com joelho no chão e não consegue se levantar... A turba vai à loucura... Avelino gargalha e nós esquecemos que estamos ali para fazer revolução e rimos do nosso líder... momento inesquecível...

Daí que quando Avelino morreu, senti muito e cheguei a integrar um comitê formado para reverenciar sua memória, participando, inclusive, como ator de uma performance que apresentávamos nos bairros de periferia para recordar o sindicalista morto. Foi num desses intervalos que nasceu a poesia Desafio, que depois virou música e levei para inscrever no VII Festival de Música Popular do Baixo e Médio Amazonas, organizado naquele ano pelo jornalista carioca Mário Ennes (creio que já falecido), que liderava o Arteclube Acauã.

Como a Dita Dura ainda respirava, as músicas tinham que passar pelo crivo da Polícia Federal, e me alertaram que estavam censurando várias canções. Com medo, resolvi mudar o título e uma frase, para poder inscrevê-la.
E acabei homenageando Tiradentes, mas pensando em Avelino.

A música foi finalista, com o arranjo e a interpretação de um radialista e crooner de conjunto muito louco chamado Dioclau Wonder (?), que trabalhou comigo na Rádio Rural.
Fizemos no palco uma performance com ele cantando e eu chegando vestido de verdugo com um capuz, amarrando uma corda em seu pescoço enquanto ele dizia a última frase do refrão caindo no palco do anfiteatro Joaquim Toscano como se tivesse sido enforcado... (eu, anta, não registrei em foto, mas alguém que esteve aquele dia lá, deve se lembrar disso, e se tiver foto que me empreste...) apesar de toda a presepada não conseguimos ganhar nenhum prêmio!

Eis a poesia, com destaque para a frase original "auto-censurada":

Tiradentes (Desafio)

Quando uma luz brilhar
Foi um filho que partiu
E mãe-terra vai chorar
Pois foi ela quem pariu
Mas do solo vai brotar
Outro homem do Brasil...
(Refrão)
E haja ódio pra parar
Essa força que surgiu
Da boca de quem gritar
Tanta dor que já sentiu
O peito vai se estampar
Cor de sangue infantil
Que jorra um dia sem parar
E transborda feito rio...

Quando o coração parar
Foi a forca que subiu
[foi a bala do fuzil]
[Que] E calou esse penar
Por cantar seu desafio
Mas a chama vai queimar
E acender nosso pavio...

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