“- Pai, tô grávida!”
Naquele dia eu havia dormido pai e acordado avô! A revelação dita em tom meio alegre e meio nervoso pela garotinha que vi nascer há 21 anos, me fez despertar para um novo mundo. Para quem andava meio acabrunhado com sinais de que a velhice vinha insistindo em bater à minha porta e dizer “oi” em plenos 44 anos, através de dores, e doenças, cansaços e estresses, agora surgia a certeza de que a vida me mostrava um novo caminho que há tanto eu perseguia: a plenitude do ser.
Há pelo menos 15 dias venho curtindo a idéia de ser avô aos 45! O neto anunciado virá ao mundo entre junho e julho do próximo ano, quando estarei completando esta idade, quem sabe até venha embrulhado em papel de presente, no próximo 13 de julho...
Já andei espalhando a notícia por aí, mas preciso andar com um lenço na mão para evitar me afogar na própria baba... Não podia continuar andando de boca em boca com tal notícia. De repente, em meio a tantas babas de “pappú” (vovô, em grego), me lembrei que também sou jornalista e que escrevo artigos num jornal e no meu blog. Então: boca no trombone para anunciar meu primeiro “engonós” (neto, em grego)! Mais um greguinho-amazônida no forno...
O anúncio desse neto me recorda o nascimento de minha primogênita – a mãe dele – que chamei de Helena (na foto abaixo, ao lado do avô-coruja) em homenagem à famosa princesa que uniu os reis da Grécia contra a mítica Tróia. Eu tinha, então, 23 anos e num dos – muitos – arroubos românticos regados à testosterona, acabei gerando uma princesinha que deu um novo alento àquela vida pós-adolescente de então. Foi depois de seu nascimento que comecei a perceber que o mundo não era feito só de aventuras. Mesmo assim, ou talvez por isso, acabei me aventurando para conhecer o mundo helênico que meu pai havia deixado atrás. Fui em busca das raízes gregas para juntá-las aos cipós amazônicos e consolidar um novo homem (não sei se consegui...).
Mas, infelizmente, minha relação com a primeira filha foi feita de altos e baixos, exatamente por levar uma vida atribulada entre jornalismo e política e nem sempre dar maior atenção à família. Quantas vezes eu esqueci(!) de buscar a linda menina loira na escolinha da professora Helena Bezerra, debruçado que estava editando matérias para um jornal que quase ninguém assistia, depois do “Jô onze e meia” no SBT? Para a minha sorte, a xará dela cuidava da menina até o desalmado pai comparecer de moto e levar a menina chorosa pra casa...
Mas deixemos de lado estas lembranças e concentremos-nos na plenitude do ser.Um dos temas recorrentes em minhas vãs filosofias é a
morte e antes dela a
velhice. Envelhecer para mim nunca foi problema. O problema é que a velhice é o corredor que nos leva à morte e até hoje não me convenci de que quero chegar ao final desse corredor. Talvez por isso vivi perigosamente, como quem quisesse desafiar a morte, apesar de morrer (ops) de medo dela...
Envelhecer é ficar mais sábio. Hoje me sinto mais seguro de mim e não temo em expressar minhas opiniões abertamente. Não mais como um kamikaze dos tempos de rebeldia sem causa e de polêmicas sem nexo. Agora estou mais para um samurai. Só não sei se estou pronto para um dia cometer um haraquiri... Quem sabe quando finalmente me aprofundar nas filosofias orientais que há muito persigo, consiga encontrar essas respostas.
A busca pela eterna juventude sempre se prendeu à busca pela imortalidade. E mais uma vez a sabedoria dos meus antepassados gregos deixa uma lição, através do belo mito de
Eos e Tithonus. Eos era a deusa da Aurora (a palavra latina aurora vem do grego auôs, que é uma outra forma de éôs). Ela era irmã de Hélios, o Sol, e de Selene, a Lua. Conta a lenda que Eos se apaixonou por um mortal célebre por sua beleza, Tithonus, irmão do rei de Tróia, Príamo. Para poder amá-lo por toda a eternidade suplicou a Zeus, deus dos deuses, que transformasse seu amado em um ser imortal como ela. Mas a apaixonada Eos se esqueceu de pedir para que ele também não envelhecesse. Tithonus, feito imortal, foi envelhecendo e ficando cada vez mais velho, tão velho que foi definhando, definhando e sem forças nem para se mexer de seu quarto até que Eos, apiedada da sorte que reservara ao seu amado transformou-o numa cigarra.
A lição que fica é que a morte faz parte da vida e não há como escapar dela. Numa das sempre superinteressantes reportagens de minha revista favorita, publicada há 5 anos, a jornalista Maria Fernanda Vomero afirmava que “é um paradoxo: a valorização da vida e a ilusão de eterna beleza e jovialidade trazidas pela vida moderna acabam gerando, por meio do apego a tudo isso, muito mais tristeza e sofrimento pelo fim inevitável da existência do que felicidade pelo mais de vida que proporcionam.”
A matéria tratava sobre a morte e como nós, principalmente os ocidentais, convivemos com o tema transformando-a em tabu desde a infância. Não ensinamos nossos filhos a conviverem com a morte, daí nosso medo da vida.
"O medo da morte nos força a viver - a nos relacionarmos, a procriarmos, a criarmos, a construirmos coisas que nos transcendam", afirma na mesma reportagem a socioantropóloga
Luce Des Aulniers, responsável pela disciplina de
Estudos Sobre a Morte, da Universidade de Quebec, em Montreal, Canadá.
Mais do que nunca começo a me convencer que a única forma de se eternizar é através de nossos feitos ou de nossa prole. O filho que gera o neto, que gera o bisneto e todas as gerações que virão. Eu por exemplo, posso ser, talvez, a concepção dos sonhos de meu bisavô grego que fugiu do lado turco no território disputado por gregos e otomanos para não perder – literalmente – a cabeça numa espada durante a guerra entre os dois povos no início do século XIX e se eternizar (nem ele sabia) em solo amazônico! A plenitude do meu ser começou com
Helena e se espalhou pelos outros filhos que gerei (
Thiago e Georgios) e até a que criei (
Carla). Todos meus
pequeNinos destinos no futuro. Daí o título acima que me leva a pensar na plenitude do ser como conseqüência da plena juventude do eterno renascer.
Agora é pensar nas fraldas, nos carrinhos, nos carinhos, na mamadeira e nas brincadeiras com o primeiro neto. De muitos que certamente virão... -------------------------------
(*) Artigo inserido em minha coluna semanal Peripatos, que circula logo hoje no Diário do Tapajós, encarte regional do Diário do Pará.