quinta-feira, 13 de julho de 2006

Fila de espera: um monumento nacional à mediocridade do atendimento(*)

Esse artigo nasceu, logicamente, enquanto eu aguardava pacientemente ser atendido numa fila. Uma não, várias! Bati o recorde de espera em filas num prazo de uma semana, já que há anos evitava enfrentá-las (principalmente nos bancos).
Como estou de férias, enfrentei algumas filas em bancos e outros estabelecimentos para resolver alguns problemas e ver se a nova Lei Municipal aprovada pela Câmara e sancionada pela prefeita já estava em funcionamento.
Para a minha surpresa, encontrei o banco com o qual trabalho (que nunca foi um primor de atendimento), já adequado para atender à clientela no novo sistema. Isso já foi um sinal positivo. Um estagiário me recebeu, fez a triagem inicial perguntando educadamente que serviço eu pretendia ali no banco. Informei que era apenas para desbloquear o meu cartão. Apertou o botão 01 de uma maquininha parecida com uma pequena registradora, de onde saiu um papelzinho com um número. Ao meu lado uma senhora gestante também pediu senha para ser atendida e ele apertou no botão 02 (atendimento preferencial).
Em seguida, fomos encaminhados a uma série de cadeiras acolchoadas e justapostas horizontalmente com um corredor no meio e em frente aos cinco caixas, todos com funcionários em ação e uma TV exibindo um dos insossos jogos da Copa do Mundo. Olhei na tela que anuncia a chamada das senhas e vi que havia 11 pessoas à minha frente. Logo pensei: “Tô ferrado!”.
À medida que as pessoas eram atendidas, a tela anunciava a nova senha. Dezessete minutos depois, lá estava eu à frente do caixa e pronto para ser atendido. Fiquei satisfeito e pensei como meus cartões: “A lei funcionou!”.
Refletindo sobre isso fiquei pensando: por que será que empresas como os bancos, que tantos lucros acumulam nos últimos governos (FHC e Lula), só se espertam para atender seus clientes depois que é aprovada uma lei que as obriga a isso? E a velha máxima que aprendi nos tempos em que já trabalhava com meu pai no balcão da lanchonete, de que “o freguês tem sempre a razão”, não vale para os clientes de bancos?
Enquanto caminhava em direção a uma empresa de telefonia celular para verificar um problema com meu aparelho, fui rememorando cenas do cotidiano que sempre acompanhei pela TV e pelos jornais, constatando que a fila faz parte da nossa história.
Lembrei das velhas filas do antigo INPS (hoje INSS), madrugada adentro em busca de uma ficha para atendimento. O quadro não mudou tanto, inclusive quando recentemente houve aquele escândalo dos idosos obrigados a sofrer em uma fila para recadastramento. Nos hospitais e no Ipasep, até hoje a prática existe. Mudaram as siglas, e não as filas.
Continuo caminhando e encontro um colega saindo de outro banco e pergunto como foi na fila, esperando um sorriso. Qual o quê? Ele detona seu banco e diz que passou quase uma hora esperando para ser atendido. Afirma categoricamente que a tal lei não funciona. Discordo, dizendo que no “meu banco” foi diferente. Ele não acredita. Despedimo-nos. Eu, orgulhoso, ele cabisbaixo.
Chego à operadora de celular e encontro o mesmo sistema de senhas e poltronas acolchoadas. Alegre com o que vi, até pensei em entrar em outras filas, só para sentir como era o atendimento. Lembrei que tinha outros problemas a resolver, e que sempre deixei a tarefa para outras pessoas da família, já que pelo horário de meu trabalho torna-se impossível enfrentar esta via crúcis. E até imaginei que poderia tirar as férias descobrindo um novo roteiro turístico: “Tour peripatético em filas de espera”. Quem sabe poderia até oferecer esse pacote para alguma agência de turismo?
Minhas divagações começaram a se tornar um pesadelo, quando vi que o atendimento na empresa de celulares estava a desejar. Pelo meu número de senha eu tinha 10 pessoas à minha frente. O número de atendentes era o dobro que o do banco, logo conclui que deveria ser atendido no mínimo no mesmo prazo, levando-se em conta que a habilitação de um celular demora mais que o pagamento de uma conta. Qual o quê? O relógio me desmentiu: já estava há uma hora na fila e nem a metade das pessoas à minha frente haviam sido atendidas!!! E olha que eu queria pagar contas de um antigo celular.
Uma hora e meia depois de entrar naquela fila, finalmente fui atendido. O olhar dos atendentes não era o mesmo de quando as empresas se implantaram por aqui e havia toda uma cordialidade para “fisgar” novos clientes. Ao que parece, como o celular virou praticamente um bem de consumo de “primeira necessidade”, eles já não se importam em nos fazer esperar nas filas. Mas existe a concorrência, pessoal...
Irritado, com fome, resolvi ir para a casa, mas não desisti da idéia de testar novas filas, afinal, tinha tido um resultado bom e outro péssimo. Faltava uma terceira tentativa para contrabalançar as opiniões.
No dia seguinte lá estava eu noutra fila de banco, só que era dia de pagamento do funcionalismo e a quantidade de pessoas havia triplicado! Aí o sistema de espera entrou em pane. Quadruplicado o número de pessoas de um dia para o outro, o atendimento das filas ficou deficiente. Com 30 pessoas à minha frente, resolvi pegar a senha e voltar dentro de uma hora acreditando que seria o suficiente para ser atendido. Quando cheguei ainda havia 20 pessoas à minha frente e passei mais meia hora aguardando! Nem mesmo o atendimento nos caixas eletrônicos funcionava a contento, por mais que o banco tenha duplicado o número de equipamentos.
Cheguei à conclusão que a lei das filas nunca poderá ser cumprida se os bancos e outras empresas não aumentarem ainda mais o número de postos de atendimento. É lógico que a situação fica dramática quando há um aumento no número de pessoas a serem atendidas. Aí seria prudente que estas empresas estivessem preparadas para terem funcionários aptos a ocupar um posto em dias de pico de atendimento.
Mas isso significa maiores investimentos em recursos humanos, e diminuição dos lucros capitalistas. Dane-se o consumidor! Farinha pouca, meu pirão primeiro, deve dizer o “empresário da fila”.
Pelo que sei, a lei não prevê, ainda, sanções mais severas para quem nem implementar os serviços necessários para acabar com essa praga nacional. Só quando doer no bolso deles é que se darão conta que existe vida humana na fila e não número e cifrões das contas bancárias.
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(*) Artigo inserido em minha coluna semana Perípatos, publicada em 11.07.2006 no Diário do Tapajós, encarte regional do jornal Diário do Pará.

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