A frase do título, para quem entende de música brasileira, é uma das mais bonitas da obra Sampa, de Caetano Veloso, o baiano que melhor descreveu São Paulo. Ela surge como constatação aos versos: “Quando eu te encarei frente a frente e não vi o meu rosto/ Chamei de mau gosto o que vi de mau gosto, mau gosto” e é a mais pura tradução do Narcisismo, um dos termos freudianos para explicar características do ser humano em relação a condição mórbida do indivíduo que tem interesse exagerado pelo próprio corpo.
O termo narcisismo, de Freud, tem suas origens numa das mais belas e tristes lendas da mitologia grega e surgiu provavelmente da superstição grega segundo a qual contemplar a própria imagem prenunciava má sorte. Narciso era um belo jovem, filho do deus-rio Cefiso e da ninfa Liríope e ao nascer, o adivinho Tirésias profetizou que ele teria vida longa desde que jamais contemplasse a própria figura. Indiferente aos sentimentos alheios, Narciso desprezou o amor de várias mulheres, entre elas a ninfa Eco. Seu egoísmo provocou o castigo dos deuses: um dia, ao observar o reflexo de seu rosto nas águas de uma fonte, apaixonou-se pela própria imagem e ficou a contemplá-la até morrer e em seu lugar surgiu a flor conhecida pelo seu nome.
Podemos concluir que vivemos hoje na Era de Narciso.
Desde a década de 1980, o culto ao corpo da chamada Geração Saúde e a programação televisiva enfatizando cada vez mais a necessidade de esculpir uma beleza estética em detrimento de uma harmonia entre corpo e mente contribuiu com a construção desse imaginário. A ditadura da beleza de Xuxas e morenas e loiras do Tchan, esculpiu ainda mais, desde a infância, a necessidade por um padrão estético que nos diferencie dos demais. Uma diferença construída a partir de um modelo único. Acaba-se aderindo à modas e perde-se a individualidade.
Academias abarrotadas, disputas nas vitrines pelas roupas da moda e está implantada a ditadura visual. A juventude já não se preocupa com o intelecto. Basta que as “minas” sejam gatas e os “manos” sejam “sarados”.
O Narcisismo toma conta do dia-a-dia e programas como os Big Brothers da vida, só ajudam a insuflar a necessidade do espelho. A tecnologia das câmeras digitais e dos flogs na internet, contribuem ainda mais na popularização desse culto à imagem.
Um celular na mão e nenhuma idéia na cabeça. Essa é imagem contra-parafraseada à versão glauberiana. Hoje basta um aparelhinho destes para que estejamos sempre batendo fotos, de preferência de nós mesmos. É só fazer um passeio em qualquer lugar público e constatar de que 11 em 10 grupos de jovens não vivem sem isso.
Tudo isso de que falo pode parecer apenas a frustração de um ogro, cuja imagem nem cabe numa telinha... Na verdade, convivi com uma geração que não se preocupava tanto com a estética da imagem, e sim com a estética das palavras. Para isso, bastando ler. Qualquer coisa, de bula de remédio a dicionário do Aurélio.
Há quem diga que uma imagem vale mais que mil palavras. Depende muito do que se quer dizer com a imagem. Se ela está no contexto de um texto sim. Mas a imagem pela imagem é um desperdício.
Essa ditadura estética da vaidade acaba abalando até mesmo quem deveria conviver harmonicamente com os efeitos da natureza. Envelhecer virou sinônimo de morrer em vida. Daí, a beleza e a jovialidade passa a ser medida pela quantidade de silicone, ou para quem não tem dinheiro, pela quantidade de enchimentos em roupas!
Nas lojas, as “desbundadas” podem encontrar inclusive enchimentos para os glúteos! Estão nos roubando até a possibilidade de adorar uma beleza natural, já que às vezes podemos estar admirando um belo par de silicones ou um enchimento de nylon.
Entretanto, o que há de mais no corpo, às vezes tem de menos na cabeça.
Daí a existência de playboys com seus carrões envenenados, com aparelhagens a mil decibéis infernizando nossos ouvidos. Pobres meninos, que provavelmente são pouco desprovidos de tutano e músculo peniano, precisando compensar com suas aparelhagens. A sociedade tolera o abuso, mas de vez em quando a Justiça freia os ânimos narcísicos que invadem o direito dos outros.
Mas esqueçam o que eu digo. Daqui há pouco serei chamado de despeitado, mesmo que me considere um narcisista.
É que para mim o que vejo no espelho é bonito. Por dentro e por fora, sem precisar de enchimentos ou de sons em alto volume...
O termo narcisismo, de Freud, tem suas origens numa das mais belas e tristes lendas da mitologia grega e surgiu provavelmente da superstição grega segundo a qual contemplar a própria imagem prenunciava má sorte. Narciso era um belo jovem, filho do deus-rio Cefiso e da ninfa Liríope e ao nascer, o adivinho Tirésias profetizou que ele teria vida longa desde que jamais contemplasse a própria figura. Indiferente aos sentimentos alheios, Narciso desprezou o amor de várias mulheres, entre elas a ninfa Eco. Seu egoísmo provocou o castigo dos deuses: um dia, ao observar o reflexo de seu rosto nas águas de uma fonte, apaixonou-se pela própria imagem e ficou a contemplá-la até morrer e em seu lugar surgiu a flor conhecida pelo seu nome.
Podemos concluir que vivemos hoje na Era de Narciso.
Desde a década de 1980, o culto ao corpo da chamada Geração Saúde e a programação televisiva enfatizando cada vez mais a necessidade de esculpir uma beleza estética em detrimento de uma harmonia entre corpo e mente contribuiu com a construção desse imaginário. A ditadura da beleza de Xuxas e morenas e loiras do Tchan, esculpiu ainda mais, desde a infância, a necessidade por um padrão estético que nos diferencie dos demais. Uma diferença construída a partir de um modelo único. Acaba-se aderindo à modas e perde-se a individualidade.
Academias abarrotadas, disputas nas vitrines pelas roupas da moda e está implantada a ditadura visual. A juventude já não se preocupa com o intelecto. Basta que as “minas” sejam gatas e os “manos” sejam “sarados”.
O Narcisismo toma conta do dia-a-dia e programas como os Big Brothers da vida, só ajudam a insuflar a necessidade do espelho. A tecnologia das câmeras digitais e dos flogs na internet, contribuem ainda mais na popularização desse culto à imagem.
Um celular na mão e nenhuma idéia na cabeça. Essa é imagem contra-parafraseada à versão glauberiana. Hoje basta um aparelhinho destes para que estejamos sempre batendo fotos, de preferência de nós mesmos. É só fazer um passeio em qualquer lugar público e constatar de que 11 em 10 grupos de jovens não vivem sem isso.
Tudo isso de que falo pode parecer apenas a frustração de um ogro, cuja imagem nem cabe numa telinha... Na verdade, convivi com uma geração que não se preocupava tanto com a estética da imagem, e sim com a estética das palavras. Para isso, bastando ler. Qualquer coisa, de bula de remédio a dicionário do Aurélio.
Há quem diga que uma imagem vale mais que mil palavras. Depende muito do que se quer dizer com a imagem. Se ela está no contexto de um texto sim. Mas a imagem pela imagem é um desperdício.
Essa ditadura estética da vaidade acaba abalando até mesmo quem deveria conviver harmonicamente com os efeitos da natureza. Envelhecer virou sinônimo de morrer em vida. Daí, a beleza e a jovialidade passa a ser medida pela quantidade de silicone, ou para quem não tem dinheiro, pela quantidade de enchimentos em roupas!
Nas lojas, as “desbundadas” podem encontrar inclusive enchimentos para os glúteos! Estão nos roubando até a possibilidade de adorar uma beleza natural, já que às vezes podemos estar admirando um belo par de silicones ou um enchimento de nylon.
Entretanto, o que há de mais no corpo, às vezes tem de menos na cabeça.
Daí a existência de playboys com seus carrões envenenados, com aparelhagens a mil decibéis infernizando nossos ouvidos. Pobres meninos, que provavelmente são pouco desprovidos de tutano e músculo peniano, precisando compensar com suas aparelhagens. A sociedade tolera o abuso, mas de vez em quando a Justiça freia os ânimos narcísicos que invadem o direito dos outros.
Mas esqueçam o que eu digo. Daqui há pouco serei chamado de despeitado, mesmo que me considere um narcisista.
É que para mim o que vejo no espelho é bonito. Por dentro e por fora, sem precisar de enchimentos ou de sons em alto volume...
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(*) Artigo inserido no dia 17.07.2007, em minha coluna semanal Perípatos, publicada no Diário do Tapajós, encarte regional do Diário do Pará. A gravura é uma reprodução da obra de Caravaggio.
Meu Deus!
ResponderExcluirAmei seu texto
Fiz uma pesquisa sobre a música de Caetano, na verdade p/ buscar informações p/ escrever uma redação e me deparei com o seu belo texto.
Parabéns!As pessoas, realmente, a cada dia estão piorando, não conseguem passar um dia sem SE olhar no espelho.