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domingo, 21 de maio de 2006

Bar doce bar...(*)

Talvez eu não seja o cara mais indicado para escrever sobre bares. Principalmente quando os bares (e seus donos) lutam incansavelmente para continuar madrugando.
Apesar de ser jornalista há mais de 20 anos e viver num mundo cercado de boemia, estou mais próximo do cara metido a intelectual, careta e que quase sempre abusa do bom senso. Sei entretanto, que há momentos para se extravasar o desbunde e tentar ser “um cidadão comum como esses que se vê na rua”, como diria o “filósofo” do cotidiano Belchior em uma de suas canções. O problema é que eu reluto para “soltar a franga” (no bom sentido, é claro...)!
Mas apesar de meus “antecedentes” de caretice, vou tentar refletir sobre o tema.
Primeiramente, o fato de eu não beber com freqüência (talvez uma vez por ano, aquele mesmo champagne do reveillon, que para bom bebedor meia caixa não basta...) não significa que tenha total repulsa aos ambientes de bar. Mas, infelizmente, há de se convir que os bares dos novos tempos estão longe de serem ambientes salutares e românticos como ocorria até meados dos anos 1980, ao ponto de serem eternizados por filmes nacionais de primeira linha (“Bar Esperança – o último que fecha, de Hugo Carvana) ou em programas musicais de televisão (o inesquecível “Bar Academia”, exibido pela TV Bandeirantes e que tinha em seu comando nada mais, nada menos, do que um grande biriteiro, como Chico Buarque de Hollanda).
Mesmo assim, vez por outra freqüento algum bar, mas sem tocar em álcool! Deixo a bebedeira para os amigos (sou até útil, pois se todo mundo ficar porre, pelo menos um poderá dirigir o carro...) e tento não me sentir um peixe fora d´água (ou seria melhor, “um bebum fora do copo”?).
Na minha adolescência, conheci vários botecos daqueles em que havia uma mesinha imunda, banquinhos de madeira ou caixas de cerveja, enquanto disputava-se uma “porrinha” para ver quem pagava a rodada. O taberneiro, esforçado, se virava para nos seduzir, fritando “suculentas” carnes de conserva com ovo e farinha, para o nosso deleite. Havia também aqueles bares com mesa de sinuca ou, em tempo de copa, com a televisão e a decoração verde-amarelo (em 82, me lembro ter ficado até porre quando o Brasil parecia que seria campeão, antes do Paolo Rossi cruzar nossa área...).
Um bar ou qualquer lugar de entretenimento, na minha concepção, sempre foi bom se a gente estava com a turma certa. Dependendo do grupo, a gente resolvia os problemas do mundo, desancava os políticos, contava a mais nova do papagaio (ou do Agapito) e falava dos melhores times do mundo: Botafogo, Paysandu e São Raimundo (os outros eram palavrões)...
Não sei se mudaram os bares ou se fomos nós que ficamos mais tolerantes e deixamos que o velho bar, doce bar, se tornasse uma coisa meio estranha.
Hoje ninguém quer (e nem pode conversar). Basta que uma televisão com os decibéis acima do tolerável, mostre o último show do Calypso ou um grupo de pagodeiros desafinados berrando aos ouvidos. Acho que o excesso de barulho é a principal causa de um modelo de bar em que, mesmo com um grande grupo, nos sintamos sozinhos.
É por tudo isso que não sou favorável que os locais de entretenimento, como bares, boates e danceterias, tenham a permissão de atazanar nossos ouvidos a qualquer hora, a qualquer dia ou qualquer lugar. Que fique claro que não sou contra a “Instituição Bar”. Mas o que temos hoje pelas esquinas são antros de poluição sonora, embebidos em álcool, onde ninguém se entende. Jovens desmiolados, gangues despudoradas e garçons sem educação, fazem destes lugares verdadeiras “sucursais do inferno” (ou na visão de Tarantino, o “Drink do Inferno”), onde o que mais importa é o lucro do “empresário da noite” e não o bem estar das pessoas.
Alguém dirá: mas se é tão ruim, porque tanta gente procura estes lugares? Como tudo o que acontece hoje, é sempre uma questão de status. Estar em um lugar que todo mundo freqüenta e do qual, no dia seguinte, as fotos estarão nos fotologs da vida, é sempre o melhor chamariz.
Não ficarei triste se os vereadores não aprovarem o projeto que beneficia meia dúzia de “empresários da noite”, em detrimento do sossego de milhares de cidadãos. Quem sabe se os limites impostos nos façam buscar a velha estrutura do nosso bar, doce bar, de antigamente. Sem muita zoeira, e mais olho no olho.
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(*) Artigo inserido em minha coluna semanal Perípatos, publicada extraordinariamente no sábado (20/05/06), no Diário do Tapajós, encarte regional do Diário do Pará.

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