Sou extremamente avesso a ritos e cerimônias. Fujo deles como o diabo foge da cruz.
Talvez por isso não tenha religião e não queira participar de organizações onde o que o mais importa é a forma e não o conteúdo. Adoro escrever, mas na hora que o formalismo acadêmico ultrapassa os limites da ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas) me sinto limitado em minha capacidade de criação.
Da mesma forma, participar de um evento com composição de mesa, paletós, gravatas, púlpitos e mestre de cerimônia... só de pensar fico com urticária!
O pânico me leva, às vezes, a cometer gafes como subir no altar da igreja na hora do casamento de um amigo para bater a foto do casal (acreditem, já fiz isso e quase fui linchado pela família do “ex-amigo”...)! Talvez por isso não tenha ido à igreja no dia do batizado da única afilhada que alguém teve a coragem de me entregar e acabei sendo representado por outra pessoa...
Será que lá no fundo do meu ser sou um anarquista trapalhão? Ou será que sofro de uma doença rara que eu chamaria de “paramentofobia” (aversão ou medo da paramentação)? Não importa: no final das contas concluo que sou um bicho do mato quando o assunto é participar de qualquer solenidade formal como casamentos, posses de presidentes ou uma simples graduação acadêmica.
Tenho dito aos colegas do meu curso de Jornalismo, que precisamos pensar numa festa de graduação diferente do que já existe de tradicional e secular... como aquele ridículo chapéu quadrado (o tal do capelo, que vem do grego e quer dizer simplesmente “chapéu”...) ou aquela pavorosa beca e os mesmos discursos de sempre. Por trás de tudo isso, empresas montadas funcionando escancaradamente nos corredores das universidades para vender o serviço completo!
Mas minha voz tem sido um eco no deserto, pois todo mundo sonha com esse momento de registrar em foto e comemorar com a parentada e amigos uma vitória pessoal depois de anos de “suplício”. Assim, como sou voto vencido, sigo a filosofia de Zeca Pagodinho: “Deixa a vida me levar, vida leva eu..”
Enquanto não sai minha formatura (essa sim, um suplício de mais de 20 anos), aqui e ali participo da formatura de outros. Por duas vezes já fui até paraninfo! Imaginam minha saia, ou melhor, beca justa? A primeira vez foi há nove anos, quando da formatura de minha esposa, socióloga. A última na semana passada, da filha mais velha, licenciada em Letras.
Não posso negar que fiquei orgulhoso de ser convidado nas duas vezes, mas ao mesmo tempo entrei em pânico só de me ver participando do cerimonial, ainda no tal do ensaio feito 24 horas antes, como ocorreu na semana passada. E se eu errar o passo? E se eu prender a gravata na cadeira? E qual é o dedo para colocar o tal anel de formatura?
O pior de tudo é que, pela ordem alfabética dos formandos, eu e minha filha teríamos que entrar primeiro no salão com uma fila atrás! E se eu tropeçar no tapete vermelho e causar o efeito dominó, jogando todos os graduandos e paraninfos no chão?
Talvez por isso não tenha religião e não queira participar de organizações onde o que o mais importa é a forma e não o conteúdo. Adoro escrever, mas na hora que o formalismo acadêmico ultrapassa os limites da ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas) me sinto limitado em minha capacidade de criação.
Da mesma forma, participar de um evento com composição de mesa, paletós, gravatas, púlpitos e mestre de cerimônia... só de pensar fico com urticária!
O pânico me leva, às vezes, a cometer gafes como subir no altar da igreja na hora do casamento de um amigo para bater a foto do casal (acreditem, já fiz isso e quase fui linchado pela família do “ex-amigo”...)! Talvez por isso não tenha ido à igreja no dia do batizado da única afilhada que alguém teve a coragem de me entregar e acabei sendo representado por outra pessoa...
Será que lá no fundo do meu ser sou um anarquista trapalhão? Ou será que sofro de uma doença rara que eu chamaria de “paramentofobia” (aversão ou medo da paramentação)? Não importa: no final das contas concluo que sou um bicho do mato quando o assunto é participar de qualquer solenidade formal como casamentos, posses de presidentes ou uma simples graduação acadêmica.
Tenho dito aos colegas do meu curso de Jornalismo, que precisamos pensar numa festa de graduação diferente do que já existe de tradicional e secular... como aquele ridículo chapéu quadrado (o tal do capelo, que vem do grego e quer dizer simplesmente “chapéu”...) ou aquela pavorosa beca e os mesmos discursos de sempre. Por trás de tudo isso, empresas montadas funcionando escancaradamente nos corredores das universidades para vender o serviço completo!
Mas minha voz tem sido um eco no deserto, pois todo mundo sonha com esse momento de registrar em foto e comemorar com a parentada e amigos uma vitória pessoal depois de anos de “suplício”. Assim, como sou voto vencido, sigo a filosofia de Zeca Pagodinho: “Deixa a vida me levar, vida leva eu..”
Enquanto não sai minha formatura (essa sim, um suplício de mais de 20 anos), aqui e ali participo da formatura de outros. Por duas vezes já fui até paraninfo! Imaginam minha saia, ou melhor, beca justa? A primeira vez foi há nove anos, quando da formatura de minha esposa, socióloga. A última na semana passada, da filha mais velha, licenciada em Letras.
Não posso negar que fiquei orgulhoso de ser convidado nas duas vezes, mas ao mesmo tempo entrei em pânico só de me ver participando do cerimonial, ainda no tal do ensaio feito 24 horas antes, como ocorreu na semana passada. E se eu errar o passo? E se eu prender a gravata na cadeira? E qual é o dedo para colocar o tal anel de formatura?
O pior de tudo é que, pela ordem alfabética dos formandos, eu e minha filha teríamos que entrar primeiro no salão com uma fila atrás! E se eu tropeçar no tapete vermelho e causar o efeito dominó, jogando todos os graduandos e paraninfos no chão?
Como conseguir dormir diante de tal estresse?
Como sempre, deixo tudo pra cima da hora: resolvi cortar as longas madeixas e a barba, estilo escova, no dia da festa e acabei me esquecendo! Enquanto em casa todo mundo se emperiquitava, lá estava eu ainda com aquela fisionomia pantagruélica de ogro peludo!
Corro atrás de salões e barbearias pela cidade e nada. Aí me lembro de uma das toscas barbearias que funcionam num distante mercado municipal. Chego lá e vejo o barbeiro fechando as portas e só me resta suplicar de joelhos e acabar sendo atendido. A barbearia maluca do vagabundo Carlitos de Charles Chaplin, no filme “O Grande Ditador”, era uma dádiva diante da pocilga em que me meti.
O barbeiro se mostra atencioso. Sento numa velha cadeira modelo “Ferrante”, enferrujada. A tesoura começa a dançar em minha cabeça, enquanto o barbeiro me conta suas aventuras em Manaus, onde trabalhou num requintado salão. Desconfio, mas tento não ficar tenso, pois se começar a tremer, talvez perca um pedaço de orelha.
O velho relógio de parede parece correr mais que o normal. A tesoura continua dançando em minha cabeça. O barbeiro conversa, mas ao que parece tudo vai bem com minha cabeleira. “Posso modelar as suíças?”, pergunta meu “barbeiro de Sevilha” já com uma navalha nas mãos. Não sei se hipnotizado – pelo velho ventilador de teto cheio de teias de aranha – acabo respondendo “sim”. Acompanho os movimentos do profissional e percebo sua maestria com a navalha. Ele mais parece um espadachim lutando com os pelos de minha face. Acabo me convencendo de que é bom de navalha.
É aí que eu faço a maior besteira do dia: “você pode fazer a minha barba?”, pergunto ao espantado barbeiro que balança a cabeça não demonstrando muita segurança. E ao terminar o cabelo é a vez da barba e do bigode.
Corro atrás de salões e barbearias pela cidade e nada. Aí me lembro de uma das toscas barbearias que funcionam num distante mercado municipal. Chego lá e vejo o barbeiro fechando as portas e só me resta suplicar de joelhos e acabar sendo atendido. A barbearia maluca do vagabundo Carlitos de Charles Chaplin, no filme “O Grande Ditador”, era uma dádiva diante da pocilga em que me meti.
O barbeiro se mostra atencioso. Sento numa velha cadeira modelo “Ferrante”, enferrujada. A tesoura começa a dançar em minha cabeça, enquanto o barbeiro me conta suas aventuras em Manaus, onde trabalhou num requintado salão. Desconfio, mas tento não ficar tenso, pois se começar a tremer, talvez perca um pedaço de orelha.
O velho relógio de parede parece correr mais que o normal. A tesoura continua dançando em minha cabeça. O barbeiro conversa, mas ao que parece tudo vai bem com minha cabeleira. “Posso modelar as suíças?”, pergunta meu “barbeiro de Sevilha” já com uma navalha nas mãos. Não sei se hipnotizado – pelo velho ventilador de teto cheio de teias de aranha – acabo respondendo “sim”. Acompanho os movimentos do profissional e percebo sua maestria com a navalha. Ele mais parece um espadachim lutando com os pelos de minha face. Acabo me convencendo de que é bom de navalha.
É aí que eu faço a maior besteira do dia: “você pode fazer a minha barba?”, pergunto ao espantado barbeiro que balança a cabeça não demonstrando muita segurança. E ao terminar o cabelo é a vez da barba e do bigode.
O ponteiro grande insiste em perseguir o pequeno no relógio da parede, e meu barbeiro parece encarnar um açougueiro. A navalha que ainda a pouco dava show nas suíças, desliza sobre minha pele sem a mesma maestria. O olhar atônito do barbeiro e o suor em sua testa me revelam que ele já não está fazendo apenas uma simples barba. Talvez seja um aprendiz de cirurgião plástico... A cada deslize, ele solta um “ops!” e recorre a pedaços de papel que cola em meu rosto. Fecho os olhos para não pensar o que está acontecendo. Depois de uma dezena de “ops” e vozes de transeuntes (feirantes e estivadores saindo do trabalho e admirados com espetáculo grotesco), um grito: “oopppppsssss!”. Abro os olhos e vejo o barbeiro agoniado.
Papel já não serve. Uma toalha tenta estancar esguichos de sangue que saem de meus lábios. Saio de minha passividade e resolvo olhar o espelho: me assusto com o Frankenstein ensangüentado que vejo à minha frente... desconsolado o barbeiro vira enfermeiro. Termina a barba e passa aos curativos. Me sinto uma múmia desfigurada.
Chego em casa escondido, mas o estrago não era tão grande quanto parecia quando me olho no espelho. Parto para uma medida radical: jogo álcool na cara e estanco as dezenas de pequenos cortes, inclusive do lábio. Meu lado sado-masoquista parece feliz e os poucos minutos que me separam da solenidade me levam a correr ainda mais. No final o resultado é aprovado: apesar das barbeiragens do “ops”!, arranco alguns “oh!”, de quem vê a transformação.
Depois de “embecado”, filha no braço, táxi de última hora, chego à universidade achando que tudo já acabou, mas o relógio de lá parece maior que o da barbearia.
Tudo corre normalmente. Até o anel do dedo entrou no lugar certo, mas como não poderia deixar de cometer uma gafe, no finalzinho da solenidade o cerimonial chama os novos graduados para apresentá-los à sociedade e o atrevido paraninfo se levanta sozinho, talvez achando que está na sua própria graduação...
Para felicidade geral da platéia, diga ao povo que eu... mico!
Papel já não serve. Uma toalha tenta estancar esguichos de sangue que saem de meus lábios. Saio de minha passividade e resolvo olhar o espelho: me assusto com o Frankenstein ensangüentado que vejo à minha frente... desconsolado o barbeiro vira enfermeiro. Termina a barba e passa aos curativos. Me sinto uma múmia desfigurada.
Chego em casa escondido, mas o estrago não era tão grande quanto parecia quando me olho no espelho. Parto para uma medida radical: jogo álcool na cara e estanco as dezenas de pequenos cortes, inclusive do lábio. Meu lado sado-masoquista parece feliz e os poucos minutos que me separam da solenidade me levam a correr ainda mais. No final o resultado é aprovado: apesar das barbeiragens do “ops”!, arranco alguns “oh!”, de quem vê a transformação.
Depois de “embecado”, filha no braço, táxi de última hora, chego à universidade achando que tudo já acabou, mas o relógio de lá parece maior que o da barbearia.
Tudo corre normalmente. Até o anel do dedo entrou no lugar certo, mas como não poderia deixar de cometer uma gafe, no finalzinho da solenidade o cerimonial chama os novos graduados para apresentá-los à sociedade e o atrevido paraninfo se levanta sozinho, talvez achando que está na sua própria graduação...
Para felicidade geral da platéia, diga ao povo que eu... mico!
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(*) Artigo inserido em minha coluna semanal Perípatos, publicada em 1º de maio de 2007, no Diário do Tapajós, encarte regional do Diário do Pará.
Gosto de todos os textos que escreves, mas esse último "Barba, cabelo, bigode e... anel no dedo" foi o melhor para mim. Está sensacional. Sou fã do teu talento textual.
ResponderExcluirFui convidada para essa colação e arrependo-me de não ter ir à cerimônia, pois perdi de ver teu visual pós-Frankenstein ensangüentado.
Vale a pena esperar, mas não nos deixa muito tempo sem o prazer de ler teus textos no blog.
Um abraço
Ahahaha..Jotérico em sua melhor forma. Delícia, brother!
ResponderExcluirAbs
Grande Jota Ninos! Receba o meu abraco do friozinho de Sao Paulo. Tudo bem por aih? :)
ResponderExcluirAi Ninos, ri muito! meu irmao deve ter ido nessa barbearia, tadinho saiu com a orelha decepada. Ficou traumatizado com esse barbeiro, barbeiro.
ResponderExcluirAmei o texto demais. Ah, o mico que vc pagou ao se levantar junto com os formandos foi sensacioanl...dei boas gargalhadas...obrigada por nos proporcionar tantas crônicas agradáveis. Sempre aprendo com você!! Abraços Enna Carvalho