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segunda-feira, 9 de abril de 2007

Carta de um “homem-peixe-jornalista” ao Diário do Pará

Tenho 43 anos, 23 dos quais atuando como jornalista sem-diploma e quase sempre mal-remunerado nesta Pérola do Tapajós. Atualmente, exatamente por circunstâncias financeiras, sou funcionário do Judiciário, mas apesar disso me recuso em abandonar a profissão com a qual me identifiquei desde a minha primeira juventude.
Além de fazer o papel de “assessor de imprensa informal”, não-remunerado, da Comarca de Santarém (autorizado pela presidência do TJE), mantenho precariamente este blog na internet e ainda arranjo um tempo para trabalhar na TV Tapajós (Globo) auxiliando a diretoria na Comunicação Corporativa da empresa.
Tal multifuncionalidade, às vezes, me impede de reagir a determinadas informações veiculadas que merecem respostas imediatas como a que passo a dar neste momento, exatamente ao jornal com o qual também colaboro semanalmente: o Diário do Pará (através de crônicas no Diário do Tapajós, seu encarte regional), e do qual já fui correspondente por duas vezes: em 1985 e em 2005, esta última a convite do empresário Jader Barbalho Filho que aqui esteve e sempre mostrou acreditar no potencial de Santarém (e do qual não acredito que comungaria com a informação irônica publicada em seu jornal, que vou comentar).
E faço isso no meu blog sem medo de estar sendo antiético, pois creio que a nota a que vou me referir, quando foi publicada, escorregou nessa mesma ética deixando-me à vontade para um desabafo que acredito ser não só dos colegas jornalistas que aqui militam, mas também dos santarenos em geral. Escrevo sem a pretensão de uma resposta ou mesmo de sua publicação no Diário do Pará.
Mas vamos ao que interessa.
Semana Santa, ao que parece, rima com peixe. Talvez por isso que um “inspirado” colega da redação do Diário do Pará resolveu jogar a mim e outras centenas de jornalistas santarenos nas águas do Tapajós! Isso deveria ser motivo de orgulho para mim, pois foi nelas que eu aprendi a nadar quando aqui cheguei há quase 30 anos! Entretanto, fui parar nestas águas numa infeliz comparação na coluna Repórter Diário, de quarta-feira (04/04), quando o editor de plantão encerrou uma nota sobre os cursos de jornalismo em funcionamento nesta cidade de forma irônica, dizendo que “Daqui a pouco (...), haverá mais jornalistas em Santarém do que peixes no rio Tapajós”...
A nota, que começou com informações interessantes sobre a disputa acirrada entre as duas instituições de ensino superior de Santarém que lançaram os cursos de Jornalismo e Publicidade, escorregou feio no final e contribuiu para denegrir com os dois cursos e com os jornalistas daqui.
Inicialmente é bom frisar que sou favorável ao diploma de Jornalismo. Tanto é que já abandonei outros dois cursos (Letras e Direito) para tentar me formar naquela que sempre foi minha profissão. E não porque precise de diploma, mas porque almejo adquirir mais conhecimentos teóricos que, aliados à minha experiência possam servir para repartir esse conhecimento com as gerações futuras, quem sabe até como docente.
Atualmente estou engajado na luta que os jornalistas travam em todo o país a favor do diploma até porque como sindicalista, num passado recente, fui um dos que lutou para vinda deste curso para Santarém, pela UFPa., no início da década de 1980, o que só se concretizou agora com as duas faculdades particulares, FIT (Faculdades Integradas do Tapajós) e Iespes (Instituto Esperança de Ensino Superior).
Não tenho procuração dos diretores de nenhuma das instituições citadas para defendê-las, mas na qualidade de ex-aluno de uma e atual aluno de outra, creio que cabe um esclarecimento sobre a tal “Guerra das faculdades” citada na nota do Diário do Pará. Essa disputa realmente aconteceu, mas creio que isso faz parte de um processo natural de conquista de mercado e depois de algum tempo, cada qual consolida suas estratégias e, provavelmente, haverá um momento em que ambas (principalmente incentivadas por seus acadêmicos) buscarão um consenso. Uma disputa desleal não serviria a nenhuma das duas faculdades (e nem acho que essa seja a intenção delas), já que o mercado de professores para os dois cursos é problemático.
É aí que o colega de Belém, ao falar dessa “guerra”, não olhou para o próprio umbigo. Se ele for um jornalista diplomado em Belém há algum tempo, provavelmente passou pela UFPa., única instituição que oferecia o curso no Pará nos últimos 30 anos. Mais recentemente a Unama implantou o seu curso e pelo que sei (alguém me corrija se eu estiver errado), há hoje outros 5 cursos de Jornalismo funcionando em Belém!
Quer dizer, será que é só o Tapajós que vai ter “mais jornalistas do que peixes”, cara-pálida do Guajará? É por essas e outras que a população dessa região luta por sua emancipação política, já que vez por outra torna-se alvo de comentários discriminatórios como esse.
É bom que o colega olhe em volta na redação, e provavelmente se depare com algum santareno, ou descendente de, trabalhando ao seu lado. O confrade Elias Ribeiro Pinto que o diga...
E se o colega pesquisar mais em outras redações ou nos cursos das universidades, fatalmente topará com outros santarenos que colaboram com o engrandecimento do jornalismo paroara. Ele mesmo citou em sua nota um deles: Manuel Dutra, um baluarte pela implantação deste curso em Santarém (ainda pela UFPa.). Sem contar com o Lúcio Flávio Pinto e tantos outros que comprovam a tradição do jornalismo santareno de qualidade iniciado há mais de 150 anos no jornal “O Amazoniense” e consolidado nas ondas do rádio nos anos 60, com a Rádio Rural, mesmo sem-diploma até hoje.
Quero lembrar ainda ao colega, que os dois cursos já estão produzindo novos talentos, alguns já estagiando em emissoras e jornais locais. Isso sem contar que os jornalistas sem-diploma experientes continuam atuando nas empresas locais, entre elas o próprio Diário do Pará, cujo casal de correspondentes (Albanira Coêlho e José Ibanês) estudam no Iespes e na FIT, respectivamente!
Na qualidade de homem-peixe-jornalista posso afirmar que quero sim me formar, exatamente para me atirar nestas águas do Tapajós e continuar revelando os mistérios desta Amazônia sem-fim. E não como um falso homem-peixe como o que foi alardeado ano passado por um dos jornais locais, em busca de maior vendagem nas bancas. Nem tampouco como o homem-peixe da Eslovênia que tanto encantou nossos olhos com suas proezas. Muito menos como o peixe/jornalista cunhado pelo ilustre desconhecido colega do Diário do Pará.
Meu caro, sem ressentimentos: que os nossos rios tenham tantos peixes quanto jornalistas competentes que ajudam a contar a história do Pará.
Diariamente.

Um comentário:

  1. Concordo em gênero, número e grau com quase tudo o que vc. escreveu, Ninos. Mas, ao meu ver, alguns retoques se fazem necessários nas tuas idéias.

    Por exemplo, essa de se exigir diploma de Jornalismo para jornalistas. Sou contra. É destoante em relação ao que se faz na grande maioria dos países em que o Jornalismo é exercido com "J" maiúsculo.

    Sou sim a favor de se exigir curso de especialização na área para quem queria entrar no marcado. Mas não de graduação.

    Quanto à preocupação do DP de aqui se ter mais jornalistas do que peixes no rio Tapajós, tomara que isso aconteça. Educação superior, educação infantil, educação secundária quanto mais, melhor.

    Quisera que todos os santarenos tivessem o canudo de Jornalismo, mais e mais a sociedade teria a ganhar. Homens e mulheres teriam um olhar mais crítico e exigente em relação à profissão, ao mundo, à vida.

    Não só isso: ficaríamos mais e mais distantes do jornalismo fla-flu (Maioranas x Barbalhos), com comprovado prejuízos para o exercício ético da profissão na Belém do Grão-Pará.

    Um exemplo de jornalismo que tem ficando raízes em todo o Estado, praga que se alstrou inclusive nesta Santarém cipoalense.

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