Volto a escrever nesta coluna depois de três semanas de afastamento, por motivos alheios à minha vontade, e me deparo com o meu calendário pessoal denunciando: já faz um ano que escrevo esta coluna!
O Perípatos estreou neste encarte do Diário do Tapajós no dia 03.10.2005, na primeira semana depois que deixei a editoria do jornal, assumida pela equipe da Agência Pódium, comandada pelo colega jornalista José Ibanês. Meus afazeres como Escrivão Judicial no Fórum de Santarém, tornavam meu tempo incompatível com a edição de um jornal, ainda que bi-semanal. Mas para não perder meu elo de ligação com o que mais gosto de fazer, me propus continuar vinculado ao jornal como colunista.
De lá para cá foram cerca de 50 artigos, sobre os mais diversos assuntos. Alguns mais lúdicos outros mais lógicos. Fui até cobrado por alguns assíduos leitores de manter um estilo menos formal. Espero poder retomar, a partir da próxima semana, o objetivo a que me propus no artigo de estréia, que seria a de “filosofar caminhando”, anotando o que vejo nesta cidade e abrindo para o debate.
Todos os artigos aqui publicados, foram inseridos em meu blog na internet, onde a troca de idéias tem se dado de forma mais instantânea. Repito abaixo o texto de estréia e depois comento:
O Perípatos estreou neste encarte do Diário do Tapajós no dia 03.10.2005, na primeira semana depois que deixei a editoria do jornal, assumida pela equipe da Agência Pódium, comandada pelo colega jornalista José Ibanês. Meus afazeres como Escrivão Judicial no Fórum de Santarém, tornavam meu tempo incompatível com a edição de um jornal, ainda que bi-semanal. Mas para não perder meu elo de ligação com o que mais gosto de fazer, me propus continuar vinculado ao jornal como colunista.
De lá para cá foram cerca de 50 artigos, sobre os mais diversos assuntos. Alguns mais lúdicos outros mais lógicos. Fui até cobrado por alguns assíduos leitores de manter um estilo menos formal. Espero poder retomar, a partir da próxima semana, o objetivo a que me propus no artigo de estréia, que seria a de “filosofar caminhando”, anotando o que vejo nesta cidade e abrindo para o debate.
Todos os artigos aqui publicados, foram inseridos em meu blog na internet, onde a troca de idéias tem se dado de forma mais instantânea. Repito abaixo o texto de estréia e depois comento:
“Um novo passeio filosófico
Começo aqui e agora um novo caminho jornalístico, nesta coluna de nome esquisito. Pra quem me conhece ou estudou um pouco de filosofia grega, deve saber que a palavra é de origem grega, como eu.
Ao retornar da Grécia, onde vivi entre 1988/1991, imaginei trilhar novos caminhos baseados nos ensinamentos filosóficos de meus ancestrais gregos, principalmente Aristóteles de quem me tornei fã. Estudei na universidade que leva seu nome, em Salônica, visitei as ruínas do castelo onde Alexandre, o grande, recebeu seus ensinamentos e sempre que ia para Atenas, não deixava de visitar a ladeira norte da Acrópolis, onde podia andar no antigo perípatos, o caminho coberto que fazia parte do Liceu, ginásio dedicado a Apolo Lykeios no qual o filósofo teria começado a ensinar sua doutrina.
Segundo consta nos apontamentos históricos, as aulas e discussões ocorriam naquele passeio coberto (em grego, perípatos), surgindo assim a filosofia peripatética de Aristóteles, baseada no diálogo com seus discípulos, enquanto caminhavam.
Aristóteles premiava o diálogo e a divulgação do conhecimento para a consecução do saber, ou seja, tudo que saía dos debates nas longas caminhadas era transformado em algo escrito. A leitura de outras obras embasava suas teorias, deixando de lado o empirismo de outros sábios, como Platão, seu mentor.
Vai daí a idéia que eu tinha em escrever sobre esta cidade, a partir de caminhadas, filosofando sobre esta “pérola abandonada”, meu Olimpo de observações. Não que eu possa chegar aos pés de um Aristóteles! Nem é essa a intenção. Na verdade, através do que eu possa escrever, seja feita uma homenagem ao método empregado pelo grande mestre.
Como não tenho um veículo próprio há muito tempo e precisava caminhar para queimar “algumas gordurinhas”, me propus a conhecer a cidade de ponta-a-ponta vendo os detalhes bons ou maus e fazendo juízo de valor. Sem discípulos, encontro as pessoas que me contam estórias e me dão opiniões. Elas não buscam um sábio, mas querem um porta-voz jornalista para suas ansiedades.
No meu perípatos do dia-a-dia encontrei o primeiro percalço: as calçadas de Santarém. Como andar numa cidade cujas calçadas são extensão das casas e cada pessoa a molda à sua imagem e semelhança? Cheguei a pelo menos uma conclusão: se a filosofia ocidental, predominantemente marcada pelos ensinamentos aristotélicos, dependesse do “perípatos da pérola”, já teria se acabado num tropeção... Triste vida de um filósofo dos trópicos...
Mas continuarei por aqui, no Diário do Tapajós, andando neste perípatos, ou melhor, driblando todos os empecilhos que possa imaginar nossa vã filosofia..”
Começo aqui e agora um novo caminho jornalístico, nesta coluna de nome esquisito. Pra quem me conhece ou estudou um pouco de filosofia grega, deve saber que a palavra é de origem grega, como eu.
Ao retornar da Grécia, onde vivi entre 1988/1991, imaginei trilhar novos caminhos baseados nos ensinamentos filosóficos de meus ancestrais gregos, principalmente Aristóteles de quem me tornei fã. Estudei na universidade que leva seu nome, em Salônica, visitei as ruínas do castelo onde Alexandre, o grande, recebeu seus ensinamentos e sempre que ia para Atenas, não deixava de visitar a ladeira norte da Acrópolis, onde podia andar no antigo perípatos, o caminho coberto que fazia parte do Liceu, ginásio dedicado a Apolo Lykeios no qual o filósofo teria começado a ensinar sua doutrina.
Segundo consta nos apontamentos históricos, as aulas e discussões ocorriam naquele passeio coberto (em grego, perípatos), surgindo assim a filosofia peripatética de Aristóteles, baseada no diálogo com seus discípulos, enquanto caminhavam.
Aristóteles premiava o diálogo e a divulgação do conhecimento para a consecução do saber, ou seja, tudo que saía dos debates nas longas caminhadas era transformado em algo escrito. A leitura de outras obras embasava suas teorias, deixando de lado o empirismo de outros sábios, como Platão, seu mentor.
Vai daí a idéia que eu tinha em escrever sobre esta cidade, a partir de caminhadas, filosofando sobre esta “pérola abandonada”, meu Olimpo de observações. Não que eu possa chegar aos pés de um Aristóteles! Nem é essa a intenção. Na verdade, através do que eu possa escrever, seja feita uma homenagem ao método empregado pelo grande mestre.
Como não tenho um veículo próprio há muito tempo e precisava caminhar para queimar “algumas gordurinhas”, me propus a conhecer a cidade de ponta-a-ponta vendo os detalhes bons ou maus e fazendo juízo de valor. Sem discípulos, encontro as pessoas que me contam estórias e me dão opiniões. Elas não buscam um sábio, mas querem um porta-voz jornalista para suas ansiedades.
No meu perípatos do dia-a-dia encontrei o primeiro percalço: as calçadas de Santarém. Como andar numa cidade cujas calçadas são extensão das casas e cada pessoa a molda à sua imagem e semelhança? Cheguei a pelo menos uma conclusão: se a filosofia ocidental, predominantemente marcada pelos ensinamentos aristotélicos, dependesse do “perípatos da pérola”, já teria se acabado num tropeção... Triste vida de um filósofo dos trópicos...
Mas continuarei por aqui, no Diário do Tapajós, andando neste perípatos, ou melhor, driblando todos os empecilhos que possa imaginar nossa vã filosofia..”
Este Perípatos é feito de alma, na mais pura essência aristotélica.
Na definição aristotélica, a alma é todo princípio vital de qualquer organismo. No homem é também a força da Razão. É imortal, puro pensamento, inviolado pela realidade. É independente da memória. A alma é, portanto, enteléquia (“essência da alma”, em grego) primeira de um corpo natural e orgânico. A alma intelectiva, diz Aristóteles, parece ser uma espécie diferente de alma. Para melhor definir a alma, ele a dividiu em três tipos: alma vegetativa, alma sensitiva e a alma racional. A alma racional seria exclusiva do homem, a sensitiva, pertenceria também aos animais, e a vegetativa, comum a todos os seres vivos.
A criação nasce do impulso criativo e da ânsia pela expressão emocional. A arte imita a vida. O prazer intelectual é o bem maior que podemos alcançar.
Em sua Ética, Aristóteles pergunta: como o homem deve viver, do que precisa para uma boa vida? Qual é o seu bem supremo? A resposta é: a felicidade (eudaimonia). Ele cita três formas em que se crê no alcance da felicidade: uma vida de prazeres ou gozos, uma vida com honra, ou política, e uma vida como filósofo. Aristóteles descarta a honra como felicidade, pois esta não é uma coisa interior, mas sim uma coisa que é conferida à pessoa por terceiros. Toda ação tende para um fim. Temos virtude porque agimos corretamente. Nada deve ser em falta ou em excesso, tudo no meio termo, ou moderadamente. A amizade é um auxílio à felicidade, que só encontramos pura em nós e do conhecimento da nossa alma. Aristóteles fala do homem ideal, que não se preocupa em demasiado, mas dá a vida nas grandes crises. Não tem maldade, não gosta de falar, enfim é pouco vaidoso.
Na Ética a Nicômaco, Aristóteles fornece a seguinte relação de vicio e de virtude:
1) a mansidão é o ponto médio entre a iracúndia (irritação) e a impassibilidade;
2) a coragem é o ponto médio entre a temeridade e a covardia;
3) a verecúndia (vergonha) é o ponto médio entre a imprudência e a timidez;
4) a temperança é o ponto médio entre a intemperança e a insensibilidade;
5) a indignação é o ponto médio entre a inveja e o excesso oposto que não tem nome;
6) a justiça é o ponto médio entre o ganho e a perda;
7) a liberalidade é o ponto médio entre a prodigalidade e a avareza;
8) a veracidade é o ponto médio entre a pretensão e o auto-desprezo;
9) a amabilidade é o ponto médio entre a hostilidade e a adulação;
10) a seriedade é o ponto médio entre a complacência e a soberba;
11) a magnanimidade é o ponto médio entre a vaidade e a estreiteza da alma;
12) a magnificência é o ponto médio entre a suntuosidade e a mesquinharia.
Nessas ações, a virtude ética é a justa medida que a razão impõe a sentimentos, ações ou atitudes, que sem o devido controle, tendem para o excesso. A justiça é considerada por Aristóteles como a virtude ética mais importante.
Perípatos é tudo isso...
Na definição aristotélica, a alma é todo princípio vital de qualquer organismo. No homem é também a força da Razão. É imortal, puro pensamento, inviolado pela realidade. É independente da memória. A alma é, portanto, enteléquia (“essência da alma”, em grego) primeira de um corpo natural e orgânico. A alma intelectiva, diz Aristóteles, parece ser uma espécie diferente de alma. Para melhor definir a alma, ele a dividiu em três tipos: alma vegetativa, alma sensitiva e a alma racional. A alma racional seria exclusiva do homem, a sensitiva, pertenceria também aos animais, e a vegetativa, comum a todos os seres vivos.
A criação nasce do impulso criativo e da ânsia pela expressão emocional. A arte imita a vida. O prazer intelectual é o bem maior que podemos alcançar.
Em sua Ética, Aristóteles pergunta: como o homem deve viver, do que precisa para uma boa vida? Qual é o seu bem supremo? A resposta é: a felicidade (eudaimonia). Ele cita três formas em que se crê no alcance da felicidade: uma vida de prazeres ou gozos, uma vida com honra, ou política, e uma vida como filósofo. Aristóteles descarta a honra como felicidade, pois esta não é uma coisa interior, mas sim uma coisa que é conferida à pessoa por terceiros. Toda ação tende para um fim. Temos virtude porque agimos corretamente. Nada deve ser em falta ou em excesso, tudo no meio termo, ou moderadamente. A amizade é um auxílio à felicidade, que só encontramos pura em nós e do conhecimento da nossa alma. Aristóteles fala do homem ideal, que não se preocupa em demasiado, mas dá a vida nas grandes crises. Não tem maldade, não gosta de falar, enfim é pouco vaidoso.
Na Ética a Nicômaco, Aristóteles fornece a seguinte relação de vicio e de virtude:
1) a mansidão é o ponto médio entre a iracúndia (irritação) e a impassibilidade;
2) a coragem é o ponto médio entre a temeridade e a covardia;
3) a verecúndia (vergonha) é o ponto médio entre a imprudência e a timidez;
4) a temperança é o ponto médio entre a intemperança e a insensibilidade;
5) a indignação é o ponto médio entre a inveja e o excesso oposto que não tem nome;
6) a justiça é o ponto médio entre o ganho e a perda;
7) a liberalidade é o ponto médio entre a prodigalidade e a avareza;
8) a veracidade é o ponto médio entre a pretensão e o auto-desprezo;
9) a amabilidade é o ponto médio entre a hostilidade e a adulação;
10) a seriedade é o ponto médio entre a complacência e a soberba;
11) a magnanimidade é o ponto médio entre a vaidade e a estreiteza da alma;
12) a magnificência é o ponto médio entre a suntuosidade e a mesquinharia.
Nessas ações, a virtude ética é a justa medida que a razão impõe a sentimentos, ações ou atitudes, que sem o devido controle, tendem para o excesso. A justiça é considerada por Aristóteles como a virtude ética mais importante.
Perípatos é tudo isso...
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(*) Artigo inserido em minha coluna semanal Perípatos, publicada na edição de hoje do Diário do Tapajós, encarte regional do Diário do Pará.
Ninos, ainda não conhecia este texto. Ele é muito interessante, gostei muito da forma como você interrelaciona a história da filosofia grega com sua história de vida naquele país e com a inexistência de perípatos em nossa cidade.
ResponderExcluirParabéns!
Ivone Aguiar
Gostei do texto, mas você deveria citar a fonte, em www.consciencia.org
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